Antero Greco (*) para O Estado de S.Paulo
Nunca mais duvido de previsão do tempo nem cravo barbadas para a seleção. Na segunda-feira, estive no Ellis Park, com uma temperatura pra lá de agradável no final de tarde, e levei na galhofa o boletim meteorológico local, que anunciava frio de rachar mamona para a hora do jogo de ontem. Também na véspera da estreia do Brasil, lasquei que a Coreia do Norte seria presa fácil, molezinha adequada para afinar o time de Dunga.
O arrependimento bateu já no momento em que sentei no banco 16 da fileira O do Bloco 46 do estádio. É isso tudo mesmo ? e imagine que ficava lá no alto da arquibancada, quase no teto. Na escalada da escadaria, o vento gelado me pegou literalmente pelo pé e subiu até o cocuruto. Adiantou pouco o amontoado de roupas com que tentei me proteger. Quebrou o galho o gorrinho de lã, do tipo mano.
O remorso aumentou alguns minutos depois que as duas equipes deram os primeiros passes e chutes, sempre ao som das vuvuzelas. O Brasil não se acertava e os coreanos, aplicados e atentos, fechavam espaços. Com o tempo, se atreveram até a desafiar a experiência e categoria de Juan e Lúcio. O rápido Jong Tae-se ensaiou dribles em velocidade.
Na hora, pensei como minhas expectativas e projeções iam pro vinagre. Eram tão atrapalhadas quanto os passes errados de Kaká, o maestro que não conseguia reger a orquestra. Ou confusas como a movimentação de Luís Fabiano, que não achava a bola na frente. Na saída para o intervalo, a seleção mereceu as vaias. E meus pés estavam frios de doer!
O Brasil se salvou pela etapa final, quando Robinho resolveu chamar a responsabilidade da armação. Abriu caminhos, desconcertou a zaga coreana e foi uma das chaves da vitória. Eficiente nos dribles, preciso no passe do gol de Elano, ainda mostrou que pode cumprir o papel de Kaká. Mereceu os elogios gerais e aproveitou a primeira chance de pagar a dívida que contraiu no Mundial da Alemanha.
A defesa teve raros sobressaltos, e o maior vacilo foi no gol. Maicon (com belo gol) e Michel Bastos se soltaram e são opções para furar retrancas. Como forma de espantar a inhaca de estreia, o resultado serviu. Só pra isso. Mas, para quem fez vários treinos "privados", se esperava algo surpreendente. Em vez disso, a seleção foi previsível, como as cutucadas de Dunga na imprensa, a inimiga que criou para espantar seus fantasmas.
Vou rezar três Aves-Marias, pra deixar de ser presunçoso e ver se a seleção melhora. Ah, e vou mergulhar os pés na água quente assim que chegar ao hotel.
(*) Jornalista esportivo e comentarista da ESPN

Nenhum comentário:
Postar um comentário