Augusto Nunes (*)
Pronto para vigiar a ofensiva semanal de José Sarney, o implacável Celso Arnaldo foi surpreendido nesta sexta-feira com a entrada em campo de Carlos Ayres Britto.
Na página 2 da Folha, o pior escritor do mundo fez estragos de bom tamanho na Copa do Mundo. Na página 3, o ministro do Supremo Tribunal Federal driblou temas jurídicos para mostrar que é craque em Michael Jackson. Com uma atuação brilhante, o caçador de cretinices conseguiu enquadrar os dois atacantes. Veja o resumo do combate:
José Sarney, que come bola há mais de 50 anos, acaba de degustar uma vuvuzela, como revela em sua coluna de hoje na Folha:
“Nesta Copa da África do Sul, confesso que não acho graça nas vuvuzelas. São sem gosto e interferem, indigestas, na alegria e nas cores que enfeitam e explodem dos torcedores”.
Ok, mas é mais fácil comer uma vuvuzela, e expeli-la sem traumas, do que engolir uma regência de Sarney – e não estou falando da presidência do Senado. “Nas cores que enfeitam e explodem dos torcedores” não só é indigesto, como, partindo do decano da Academia Brasileira de Letras, provoca vômito.
Aliás, a nova Folha, o jornal do futuro, parece querer transformar seu leitor num ganso de foie gras, forçando-o, goela abaixo, a deglutir seus colunistas.
Hoje, na página ao lado de Sarney, há uma pensata de Carlos Ayres de Britto sobre… Michael Jackson.
Só na Folha um ministro do Supremo, em vez de discorrer sobre Cesare Battisti, analisa a insustentável leveza do Rei do Pop e descobre que o ar tem pele.
Mas reconheça-se a coerência do articulista: “Michael Jackson e a pele do ar” é escrito na linguagem de uma sentença do Supremo julgando a ética das células-tronco:
“Dissolvia-se na sua própria dança, por havê-la conduzido ao esplendor quântico da partícula que se faz onda. Da matéria que se faz éter. Do mármore bruto que se faz “A Pietà” de Michelangelo.
Aqui e ali, o magistrado dá vazão ao bardo Ayres Britto, companheiro de estrofes fesceninas de Eros Grau, como na produção deste parágrafo que parece extraído de um processo de pedofilia que foi bater no Supremo:
“Fusão da graça virginal dos meninos com a mais séria compenetração profissional dos adultos. Da volubilidade assustada dos olhos com a tenacidade de um espírito capaz de todos os sacrifícios pela arte. Fusão, em suma, do dançarino e da dança”.
Em suma, a fusão do advogado com a advocacia, do juiz com o juizado, do escritor com a escrita resulta neste despacho:
“Permanece com a sua dança hipnótica na pele do ar que a humanidade respira, com os demais seres viventes deste arrepiante, emocional planeta azul. Thriller…”
Arrepiante, sem dúvida.
(*) Ex-Diretor do Jornal do Brasil, do Jornal Gazeta Mercantil e Revista Forbes. Atualmente na Revista Veja.
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