Opinião do Estadão
O governo tem adotado medidas para dar mais competitividade à indústria instalada no País, mas até agora não atacou fatores estruturais que fazem do Brasil um dos países mais caros do mundo para a produção de manufaturas. Um exemplo é o custo da energia elétrica fornecida à indústria, 52% maior do que a tarifa média internacional, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), citada em recente estudo divulgado pela Firjan. O levantamento da IEA mostrou que a tarifa média cobrada da indústria brasileira era de R$ 329 por megawatt-hora (MWh) em comparação com a média de R$ 215,50 por MWh em 27 países analisados. Isso não só prejudica a capacidade dos produtos brasileiros de concorrer no mercado internacional, mas afeta diretamente os preços internos para o consumidor, favorecendo a aquisição de similares importados, com efeitos danosos sobre os níveis de emprego no País.
Como os industriais têm salientado, isso é um contrassenso em um país que tanto investiu e continua a investir pesado em energia hidrelétrica, fonte renovável, limpa e muito mais barata do que a queima de combustíveis fósseis para produzir eletricidade, como se verifica em muitos países industrializados. A energia elétrica é muito cara no Brasil principalmente por causa da carga tributária que incide sobre as tarifas. O mesmo estudo mostra que os tributos federais, incluindo o PIS/Cofins, com alíquota variável entre 12% e 15%, e o ICMS cobrado pelos Estados, representam, em média, 31,5% da tarifa final. A alíquota média do ICMS sobre consumo de energia é de 25%, mas há Estados em que esse tributo alcança 40%.
Os responsáveis pela condução da política econômica não desconhecem esse problema. As reivindicações da indústria e ameaças de multinacionais de fechar as portas de subsidiárias no País, dado o alto custo de energia elétrica, estão "emparedando" o governo, como disse uma fonte de Brasília a este jornal. Buscando uma saída, começou um jogo de empurra entre a União e os Estados. O governo aceitaria baixar seus tributos, se os Estados concordassem em fazer o mesmo com relação ao ICMS. Com essa finalidade, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, planeja apresentar uma proposta da União ao Conselho de Política Fazendária (Confaz), composto pelos secretários da Fazenda dos Estados. Dessa reunião do colegiado deveria sair uma decisão "conjunta" para reduzir a carga tributária sobre as contas de eletricidade pagas pela indústria.
Tudo isso cheira a encenação. Se o governo federal estivesse decidido a fazer essa desoneração, poderia baixar a alíquota do PIS/Cofins de imediato sobre o consumo industrial de eletricidade, antes de convocar reunião do Confaz. Com isso, teria autoridade moral para induzir os Estados a reduzirem suas alíquotas de ICMS sobre as contas de luz, e argumentos para isso não faltariam.
Empenhados em atrair indústrias para seus territórios, os Estados, com exceções, têm concedido incentivos fiscais a torto e a direito a empreendimentos diversos, no contexto da guerra fiscal, ao arrepio da lei. Contudo, esses incentivos não atingem o ICMS sobre as contas de eletricidade, cuja cobrança é uma fonte fácil e garantida de arrecadação. Os governos estaduais não se dão conta de que podem perder fábricas se continuarem com alíquotas tão elevadas de ICMS sobre energia, pois induzem investidores a buscar condições mais favoráveis em outros países.
Condicionar a decisão federal a um acerto prévio com os Estados só complica a situação, como mostra a reação dos governadores que já reivindicam "compensações". Há pleitos legítimos dos Estados que devem ser levados em consideração pelo Executivo e pelo Congresso, mas a redução da carga tributária sobre eletricidade para a indústria deve estar acima dessas questões. Trata-se de dar mais competitividade à indústria nacional como um todo - aí incluído o setor agroindustrial. O que está em jogo é a capacidade de o Brasil poder firmar-se como potência industrial em um mundo agressivamente competitivo.
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