quarta-feira, 25 de abril de 2012

As merdas que a TV aberta brasileira exibe

Palavras do ator Wagner Moura sobre o Pânico na TV, em carta aberta

Texto antigo porém bem atual (*)

Globo.com:

“Quando estava saindo da cerimônia de entrega do prêmio APCA, há duas semanas em São Paulo, fui abordado por um rapaz meio abobalhado. Ele disse que me amava, chegou a me dar um beijo no rosto e pediu uma entrevista para seu programa de TV no interior.

Mesmo estando com o táxi de porta aberta me esperando, achei que seria rude sair andando e negar a entrevista, que de alguma forma poderia ajudar o cara, sei lá, eu sou da época da gentileza, do muito obrigado e do por favor, acredito no ser humano e ainda sou canceriano e baiano, ou seja, um babaca total.

Ele me perguntou uma ou duas bobagens, e eu respondi, quando, de repente, apareceu outro apresentador do programa com a mão melecada de gel, passou na minha cabeça e ficou olhando para a câmera rindo. Foi tão surreal que no começo eu não acreditei, depois fui percebendo que estava fazendo parte de um programa de TV, desses que sacaneiam as pessoas.

Na hora eu pensei, como qualquer homem que sofre uma agressão, em enfiar a porrada no garoto, mas imediatamente entendi que era isso mesmo que ele queria, e aí bateu uma profunda tristeza com a condição humana, e tudo que consegui foi suspirar algo tipo “que coisa horrível” (o horror, o horror), virar as costas e entrar no carro.

Mesmo assim fui perseguido por eles. Não satisfeito, o rapaz abriu a porta do táxi depois que eu entrei, eu tentei fechar de novo, e ele colocou a perna, uma coisa horrorosa, violenta mesmo. Tive vontade de dizer: cara, cê tá louco, me respeita, eu sou um pai de família! Mas fiquei quieto, tipo assalto, em que reagir é pior. .....”

O que vai na cabeça de um sujeito que tem como profissão jogar meleca nos outros?
É a espetacularização da babaquice ”

O táxi foi embora. No caminho, eu pensava no fundo do poço em que chegamos. Meu Deus, será que alguém realmente acha que jogar meleca nos outros é engraçado?
Qual será o próximo passo? Tacar cocô nas pessoas? Atingir os incautos com pedaços de pau para o deleite sorridente do telespectador?

Compartilho minha indignação porque sei que ela diz respeito a muitos; pessoas públicas ou anônimas, que não compactuam com esse circo de horrores que faz, por exemplo, com que uma emissora de TV passe o dia INTEIRO mostrando imagens da menina Isabella.

Estamos nos bestializando, nos idiotizando. O que vai na cabeça de um sujeito que tem como profissão jogar meleca nos outros? É a espetacularização da babaquice.
Amigos, a mediocridade é amiga da barbárie! E a coisa tá feia.

” Isso naturalmente não o impediu de colocar a cagada no ar. Afinal de contas, vai dar mais audiência ”

Digo isso com a consciência de quem nunca jogou o jogo bobo da celebridade. Não sou celebridade de nada, sou ator. Entendo que apareço na TV das pessoas e gosto quando alguém vem dizer que curte meu trabalho, assim como deve gostar o jornalista, o médico ou o carpinteiro que ouve um elogio. Gosto de ser conhecido pelo que faço, mas não suporto falta de educação.

O preço da fama? Não engulo essa. Tive pai e mãe. Tinham pais esses paparazzi que mataram a princesa Diana? É jornalismo isso?

Aliás, dá para ter respeito por um sujeito que fica escondido atrás de uma árvore para fotografar uma criança no parquinho? Dois deles perseguiram uma amiga atriz, grávida de oito meses, por dois quarteirões. Ela passou mal, e os caras continuaram fotografando. Perseguir uma grávida? Ah, mas tá reclamando de quê? Não é famoso? Então agüenta!

O que que é isso, gente?

Du Moscovis e Lázaro (Ramos) também já escreveram sobre o assunto, e eu acho que tem, sim, que haver alguma reação por parte dos que não estão a fim de alimentar essa palhaçada.
Existe, sim, gente inteligente que não dá a mínima para as fofocas das revistas e as baixarias dos programas de TV.
Existe, sim, gente que tem outros valores, como meus amigos do MHuD (Movimento Humanos Direitos), que estão preocupados é em combater o trabalho escravo, a prostituição infantil, a violência agrária, os grandes latifúndios, o aquecimento global e a corrupção.

Fazer algo de útil com essa vida efêmera, sem nunca abrir mão do bom humor.
Há, sim, gente que pensa diferente. E exigimos, no mínimo, não sermos melecados.

No dia seguinte, o rapaz do programa mandou um e-mail para o escritório que me agencia se desculpando por, segundo suas palavras, a “cagada” que havia feito.

Isso naturalmente não o impediu de colocar a cagada no ar.

Afinal de contas, vai dar mais audiência. E contra a audiência não há argumentos.

Será?"

(*) Ao postar, deixei de mencionar que se tratava de um texto antigo, (4 anos atrás - não imaginava que já tivesse passado tanto tempo) porém,  bem atual , como prontamente me corrigiu e me lembrou o leitor e amigo jornalista Jota Ninos . Valeu Jota

2 comentários:

  1. Mediocridade e barbárie

    A situação narrada no seu blog, caro Antenor, ocorreu há quatro anos e, na época, o desabafo do ator acabou surtindo efeito: a indignação tomou conta de todos os meios de comunicação e a Rede TV! acabou tendo que tirar o quadro do ar (não sem antes exibir a humilhação ao WM)! Mas o texto continua atual.

    A baixaria na TV continua, pois a busca pela audiência não respeita qualquer limite ético. Só que quando se fala em conter alguns desses exageros, através de órgãos regulatórios, logo a mídia se contorce falando em "censura" e ataque à "liberdade de expressão"!

    Os canais de TV e Rádio são concessões públicas e, portanto, precisam ter marcos regulatórios mínimos, para que se evite que o grotesco ocupe os espaços públicos. Mas a mídia já tem sempre uma ladainha pronta: "o único controle para programação das emissoras que deve prevalecer é o controle remoto", dizem.

    Ou seja, todo o poder ao cidadão de "livremente" escolher o que assistir... mas nós sabemos que por conta dos problemas da educação em países como o nosso, não se criam os "filtros" certos para as famílias terem controle sobre o que os filhos devem ou não assistir...

    Enquanto isso, continuaremos sendo bombardeados por BBBs e outros espetáculos de horrores patrocinados por programas sensacionalistas que lutam por pontinhos na audiência...

    Mas a frase lapidar do ator Wagner Moura, ilustra bem esse caos televisivo que ainda hoje vivemos: "A mediocridade é amiga da barbárie!".

    Valha-nos quem?

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  2. Caro amigo Jota .
    Mais uma vez obrigado pela audiência constante.
    Da mesma forma agradeço por me lembrar a respeito do texto já ser antigo. Acabei postando sem incluir que se tratava de texto antigo mas atual.
    De qualquer modo a intenção foi justamente essa de mostrar que a TV aberta de forma geral está uma grande merda. Impossivel conseguir assistir algo que preste. Até os programas esportivos se tornaram apelativos para chamar audiência.Uma coisa absurda e se imagina que nesse meio existam pessoas inteligentes e bem formadas que poderiam proporcionar uma programação um pouco melhor.
    Valeu amigão
    Forte abraço, saúde e sucesso constante que vc merece.

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