Proteção Ambiental e Agricultura: será tão simples criticar?
O Centro Acadêmico de Gestão Ambiental (CAGeA), órgão acadêmico representativo dos estudantes do curso de Gestão Ambiental da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, em razão do texto redigido por Richard Jakubaszko (Carlos Minc, o ministro turrão), publicado em seu blog no dia 13 de setembro e veiculado pela internet nas últimas semanas, vem a público opinar sobre algumas questões levantadas pelo autor.
Essa manifestação tem por objetivo possibilitar o exercício de reflexão sobre a parcialidade com a qual certos profissionais tratam questões complexas como o meio ambiente, e também sobre o radicalismo, que dificulta sobremaneira o entendimento e a construção conjunta de nossa realidade.
Por meio de xingamentos e outras artimanhas linguisticas, o autor tenta bestializar a postura do Ministro do Meio Ambiente na defesa das bases jurídicas para a proteção das florestas no Brasil, isto é, as disposições legais dessa natureza presentes no Código Florestal Brasileiro.
Apoiar politicamente o Ministro da Agricultura nesse debate, postando-se a favor de suas propostas para a alteração do Código Florestal é prerrogativa de qualquer cidadão. Enquanto ente político, o indivíduo tem o direito de se posicionar de acordo com suas convicções e anseios sociais, embora seja mais salutar que o faça a partir de uma análise crítica da realidade na qual quer intervir.
Até aí, um direito social.
No entanto, a questão ambiental não é mera política.
Política é a decisão, mas para chegar a ela em termos de meio ambiente , há, no mínimo, fatores técnicos muito importantes a serem considerados. Essa parte técnica geralmente está ligada a diagnósticos, estudos e extrapolações que permitam diminuir as dúvidas em relação à implementação de tais políticas.
Mas que dúvidas seriam essas? Dentre elas poderíamos fazer menção à que, talvez, seja uma das mais importantes: “Qual a capacidade de suporte desse ambiente à intervenção proposta, seja ela social ou tecnológica?”; ou ainda, em português claro: “Quanto o ambiente agüenta de alteração?”.
É disso que se trata quando nos referimos às bases técnicas de políticas ambientais. Ainda nessa linha, é por isso que foi instituído, no Direito Ambiental, o Princípio da Precauç&atil de;o, o qual determina que na ausência de certeza técnica/científica é melhor não intervir.
Considerando esse raciocínio, não se pode simplesmente desconsiderar, como faz o autor, a importância do bioma Cerrado e de sua preservação, considerando-o como tendo “vocação para ser uma imensa savana, portanto um solo degradado”. Segundo dados da Embrapa, que apontam para a relevância da conservação da vegetação nativa no Cerrado, 94% da água que corre na Bacia do Rio São Francisco em direção ao Nordeste provém do Cerrado, apesar de apenas 47% da bacia estar dentro inserida nesse bioma.
No caso do sistema Araguaia-Tocantins, que drena para o Norte e deságua no Pará, 71% da água nasce no Cerrado.
A proporção é a mesma para o conjunto das Bacias do Paraguai e do Paranaaçú, que drenam grandes áreas do Centro-Sul.
Isso sem discutir a questão da biodiversidade.
Ainda, para ilustrar a relevância maior da agricultura em relação ao meio ambiente, o autor recorre à típica argumentação de que “(...) se faz agricultura para produzir alimentos e biocombustíveis (...)” e que “(...) para estancar a oferta de alimentos precisaria reduzir antes o número de bocas que gostam de comida (...)”. De fato, a importância da agricultura é incontestável, ainda mais quando se pensa no crescimento populacional que enfrentaremos neste planeta. Mas isso nos permite abrir mão de nossos recursos e serviços ambientais, que também são essenciais para o ser humano, em favor do crescimento da agricultura?
E onde está a discussão sobre a eficiência?
Tanto em produção quanto em distribuição? O setor industrial conseguiu, na última década, performances importantes em relação a esse aspecto.
Tal postura, guardadas as diferenças entre tais setores, também deveria ser uma bandeira para a agricultura, pois do mesmo modo que a alimentação é um direito fundamental do ser humano, assim o é o direito à qualidade de vida e ao meio ambiente equilibrado.
A diferença crucial é que sem alimento perecemos rapidamente enquanto organismos, mas e sem os recursos e serviços ambientais necessários, será que não pereceremos enquanto sociedade?
Acima foi utilizado propositalmente o termo crescimento da agricultura.
O propósito foi justamente o de contrastar com a idéia de desenvolvimento da agricultura. Se o foco fosse desenvolver a agricultura, com todo o valor qualitativo e coletivo que o termo abarca, não haveri a tanto o que temer em relação ao ambiente.
Principalmente, a sociedade não haveria de estar discutindo a supressão de normas de defesa ambiental como maneira de viabilizar uma atividade econômica.
Adotando esse ponto de vista, nota-se que por meio do abrandamento da tutela ambiental quem se inviabiliza é a própria atividade econômica, pois sua base é estruturada na existência e utilização dos mesmos recursos que pretende continuar utilizando de maneira ineficiente.
Eis o fundamento da insustentabilidade.
Assim, o intuito dessas palavras é demonstrar que não há lugar para personalismos contra o ministro “x” ou “y”, para a parcialidade e nem para radicalismos na discussão da proteção ao meio ambiente.
O problema é muito mais amplo e complexo, e por isso, são necessárias soluções também complexas que envolverão diversos atores sociais. Soluções estas que, necessariamente, deverão ser pautadas por ética, conhecimento técnico, comprometimento com a coletividade e, por fim, real vontade política.
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