sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Mães Más

Dr. Carlos Hecktheuer (*)

 Um dia quando meus filhos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e mães, eu hei de dizer-lhes:

--- Eu os amei o suficiente para ter perguntado aonde vão, com quem vão e a que horas regressarão.

--- Eu os amei o suficiente para não ter ficado em silêncio e fazer com que vocês soubessem que aquele novo amigo não era boa companhia.

--- Eu os amei o suficiente para os fazer pagar as balas que tiraram do supermercado ou revistas do jornaleiro, e os fazer dizer ao dono: " Nós pegamos isto ontem e queríamos pagar".

--- Eu os amei o suficiente para ter ficado em pé junto de vocês, duas horas, enquanto limpavam o seu quarto, tarefa que eu teria feito em 15 minutos.

 --- Eu os amei o suficiente para os deixar ver além do amor que eu sentia por vocês, o desapontamento e também as lágrimas nos meus olhos.

--- Eu os amei o suficiente para os deixar assumir a responsabilidade das suas ações, mesmo quando as penalidades eram tão duras que me partiam o coração.

Mais do que tudo, eu os amei o suficiente para dizer-lhes não, quando eu sabia que vocês poderiam me odiar por isso (e em momentos até odiaram).

Essas eram as mais difíceis batalhas de todas. Estou contente, venci... Porque no final vocês venceram também! E em qualquer dia, quando meus netos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e mães; quando eles lhes perguntarem se sua mãe era má, meus filhos vão lhes dizer:

-- "Sim, nossa mãe era má. Era a mãe mais má do mundo...". As outras crianças comiam doces no café e nós tínhamos que comer cereais, ovos torradas. As outras crianças bebiam refrigerantes e comiam batatas fritas e sorvetes no almoço e nós tínhamos que comer arroz, feijão, carne, legumes e frutas. E ela nos obrigava a jantar à mesa, bem diferente das outras mães que deixavam seus filhos comerem vendo televisão. Ela insistia em saber onde estávamos à toda hora (tocava nosso celular de madrugada e "fuçava" nos nossos e-mails). Era quase uma prisão! Mamãe tinha que saber quem eram nossos amigos e o que nós fazíamos com eles. Insistia, que lhe disséssemos com quem íamos sair, mesmo que demorássemos apenas uma hora ou menos.

Nós tínhamos vergonha de admitir, mas ela "violava as leis do trabalho infantil". Nós tínhamos que tirar a louça da mesa, arrumar nossas bagunças, esvaziar o lixo e fazer todo esse tipo de trabalho que achávamos cruéis. Eu acho que ela nem dormia á noite, pensando em coisas para nos mandar fazer. Ela insistia sempre conosco para que lhe disséssemos sempre a verdade e apenas a verdade. E quando éramos adolescentes, ela conseguia até ler os nossos pensamentos. A nossa vida era mesmo chata! Ela não deixava os nossos amigos tocarem a buzina para que saíssemos; tinham que subir, bater à porta, para ela os conhecer. Enquanto todos podiam voltar tarde da noite com 12 anos, tivemos que esperar pelos 16 para chegar um pouco mais tarde, e aquela chata levantava para saber se a festa foi boa ( só para ver como estávamos ao voltar ).

Por causa de nossa mãe, nós perdemos imensas experiências na adolescência: - Nenhum de nós esteve envolvido com drogas, em roubo, em atos de vandalismo, em violação de propriedade, nem fomos presos por nenhum crime.

FOI TUDO POR CAUSA DELA!
Agora que já somos adultos, honestos e educados, estamos a fazer o nosso melhor para sermos "PAIS MAUS", como minha mãe foi.

CREIO QUE ESTE É UM DOS MALES DO MUNDO DE HOJE: NÃO HÁ SUFICIENTES MÃES MÁS!

(*) Médico Psiquiatra de Passo Fundo – Rio Grande do Sul

O texto, acima , foi entregue pelo professor de Ética e Cidadania da Escola Objetivo Americana, Sr. Roberto Candelori, à todos os alunos da sala de aula, para que entregassem à seus pais. A única condição solicitada pelo mesmo, foi de que cada aluno ficasse ao lado dos pais até que terminassem a leitura. Nos dias de hoje, sementes plantadas como a deste professor, creio que devem ser repassadas; afinal, o futuro pertence às nossas crianças e somos nós que as orientamos para a vida!

O texto também foi publicado por ocasião da morte de Tarcila Gusmão e Maria Eduarda Dourado, ambas de 16 anos, em Maracaípe - Porto de Galinhas, Pernambuco. Depois de 13 dias desaparecidas, as mães revelaram desconhecer os proprietários da casa onde as filhas tinham ido curtir o fim de semana. A tragédia abalou a opinião pública.

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