Foi com FHC, e não com Lula, que o Brasil começou a se aproximar da Venezuela
Eliane Cantanhêde (*)
Diferentemente do que alardeiam petistas e tucanos, por motivos opostos, a aproximação do Brasil com a Venezuela de Hugo Chávez começou nos governos FHC, a quem Chávez chamava de "mi maestro", e apenas foi aprofundada nos anos Lula.
Eleito, Chávez, ex-coronel golpista, ao dar as costas aos EUA e virar à América do Sul, despertou a cobiça de empresas brasileiras pelo enorme potencial venezuelano.
O governo de FHC foi o canal. Seu embaixador em Caracas, Rui Nogueira (depois secretário-geral do Itamaraty até a semana passada), o operador. A embaixada virou ponto político e econômico nevrálgico. Tudo pelo pragmatismo.
Desembarcar em Caracas, já no primeiro ano de Chávez, era se deparar com inúmeras placas com nomes de executivos da Petrobras, da Embraer, do BNDES e, claro, das grandes empreiteiras, como Odebrecht e Camargo Corrêa.
Dependente do petróleo, a Venezuela carecia de uma planta industrial, era uma terra de infindáveis negócios a ser desbravada. Tinha dinheiro e não produzia nada.
Os encontros de Chávez e FHC se multiplicaram. Eram regados a drinques, piadas, histórias. Duravam horas.
Só nas eleições de 2002, Chávez se afastou de FHC e deu de ombros à prudência diplomática ao apoiar ostensivamente o candidato da oposição, Lula, com quem tinha mais afinidade ideológica.
Essa posição rendeu uma troca pública de desaforos entre Chávez e o candidato do PSDB, José Serra. Só aí os tucanos "descobriram" o viés autoritário do projeto chavista, que veio a se intitular "socialismo do século 21".
Os anos Lula foram de muita intimidade e negócios, com destaque para o projeto de uma refinaria conjunta no Brasil e a construção de uma ponte sobre o rio Orinoco.
A proximidade causou estremecimentos entre Brasília e Washington, como quando os EUA não autorizaram a Embraer a vender aviões Super Tucano --com tecnologia norte-americana-- à Venezuela. Chávez então foi às compras militares na Rússia.
Os dois países também criaram, em 2008, um mecanismo de consultas e de programas comuns que envolve reuniões presidenciais trimestrais. Dilma manteve a prática. O Brasil também foi decisivo para garantir, sob polêmica, a Venezuela no Mercosul.
Apesar das relações estreitas, Lula e Chávez também disputavam liderança e estilo na América do Sul, entre o "lulismo" e o "chavismo". Aparentemente, venceu o primeiro. Os seguidores de Chávez e de seu projeto bolivariano são Equador e Bolívia. Os demais preferem a negociação e a boa convivência com os EUA, ainda a maior potência --e o maior mercado-- mundial.
(*) Jornalista é colunista da Folha de São Paulo
Eliane Cantanhêde (*)
Diferentemente do que alardeiam petistas e tucanos, por motivos opostos, a aproximação do Brasil com a Venezuela de Hugo Chávez começou nos governos FHC, a quem Chávez chamava de "mi maestro", e apenas foi aprofundada nos anos Lula.
Eleito, Chávez, ex-coronel golpista, ao dar as costas aos EUA e virar à América do Sul, despertou a cobiça de empresas brasileiras pelo enorme potencial venezuelano.
O governo de FHC foi o canal. Seu embaixador em Caracas, Rui Nogueira (depois secretário-geral do Itamaraty até a semana passada), o operador. A embaixada virou ponto político e econômico nevrálgico. Tudo pelo pragmatismo.
Desembarcar em Caracas, já no primeiro ano de Chávez, era se deparar com inúmeras placas com nomes de executivos da Petrobras, da Embraer, do BNDES e, claro, das grandes empreiteiras, como Odebrecht e Camargo Corrêa.
Dependente do petróleo, a Venezuela carecia de uma planta industrial, era uma terra de infindáveis negócios a ser desbravada. Tinha dinheiro e não produzia nada.
Os encontros de Chávez e FHC se multiplicaram. Eram regados a drinques, piadas, histórias. Duravam horas.
Só nas eleições de 2002, Chávez se afastou de FHC e deu de ombros à prudência diplomática ao apoiar ostensivamente o candidato da oposição, Lula, com quem tinha mais afinidade ideológica.
Essa posição rendeu uma troca pública de desaforos entre Chávez e o candidato do PSDB, José Serra. Só aí os tucanos "descobriram" o viés autoritário do projeto chavista, que veio a se intitular "socialismo do século 21".
Os anos Lula foram de muita intimidade e negócios, com destaque para o projeto de uma refinaria conjunta no Brasil e a construção de uma ponte sobre o rio Orinoco.
A proximidade causou estremecimentos entre Brasília e Washington, como quando os EUA não autorizaram a Embraer a vender aviões Super Tucano --com tecnologia norte-americana-- à Venezuela. Chávez então foi às compras militares na Rússia.
Os dois países também criaram, em 2008, um mecanismo de consultas e de programas comuns que envolve reuniões presidenciais trimestrais. Dilma manteve a prática. O Brasil também foi decisivo para garantir, sob polêmica, a Venezuela no Mercosul.
Apesar das relações estreitas, Lula e Chávez também disputavam liderança e estilo na América do Sul, entre o "lulismo" e o "chavismo". Aparentemente, venceu o primeiro. Os seguidores de Chávez e de seu projeto bolivariano são Equador e Bolívia. Os demais preferem a negociação e a boa convivência com os EUA, ainda a maior potência --e o maior mercado-- mundial.
(*) Jornalista é colunista da Folha de São Paulo
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