A fusão do Pão de Açucar com o Carrefour: o BNDES entra com R$4 bilhões para favorecer um empresário de estimação
Augusto Nunes (*)
Ao implodir todas as falácias forjadas pelo governo e pela direção do BNDES para explicar a inexplicável injeção de R$4 bilhões na fusão do Pão de Açúcar e do Carrefour, o artigo de Carlos Alberto Sardenberg publicado na seção Feira Livre deixou claro que a operação foi montada para favorecer o empresário Abílio Diniz. Para confirmar em última instância o curto e preciso diagnóstico do senador Aloysio Nunes Ferreira, que qualificou o negócio de “absurdo e escandaloso”, só faltava a entrada em cena do advogado Márcio Thomaz Bastos. Agora não falta mais nada: ao contratar o advogado-geral do Planalto para representá-lo, Abílio produziu simultaneamente uma confissão de culpa e outro indício veemente de que o governo se meteu em outra enrascada de bom tamanho.
Criminalista talentoso, Márcio vem esbanjando inventividade desde 2005, quando abandonou as funções de ministro da Justiça para livrar da cadeia os quadrilheiros do mensalão. Transformou crime em erro, ladrão em tesoureiro distraído e produto do roubo em recursos não-contabilizados. Decerto encontrará alquimias menos bisonhas que as apresentadas pelos trapalhões federais. O mais recente se ampara na necessidade de defender a pátria ameaçada por vorazes concorrentes internacionais. “O patriotismo é o último reduto dos canalhas”, disse o escritor inglês Samuel Johnson. Como qualquer generalização, essa também é perigosa. Mas se aplica exemplarmente aos nacionalistas de araque em ação neste início de inverno.
“O mérito da operação é criar maioria nacional num conglomerado internacional”, recitou nesta quinta-feira o mineiro Fernando Pimentel, que ganhou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior por ter naufragado na tentativa de virar senador. O fervor nacionalista contagiou o vice-presidente do BNDES, João Carlos Ferraz: “A bandeira verde e amarela é sempre importante”, declamou a jornalistas interessados em saber se a doação bilionária tem motivações técnicas ou políticas. Se fosse tão importante assim, deixaram de replicar os repórteres, o banco não estaria financiando aventuras em Cuba, na Venezuela e em outras paragens controladas por parentes ideológicos do PT.
É muito cinismo, berram os fatos. Até as gôndolas dos supermercados sabem que Abílio Diniz foi um generoso patrocinador das campanhas eleitorais de Lula e Dilma Rousseff. Tornou-se amigo de infância de Lula e continua a entrar sem bater nos gabinetes federais ocupados por quem manda. Por algum motivo, arrependeu-se de ter vendido o controle do Pão de Açúcar aos sócios franceses do grupo francês Casino, resolveu romper o contrato e, para manter-se entre os barões do reino, pensou na fusão com o Carrefour. Se a ideia fosse boa, não lhe faltariam parceiros na iniciativa privada. Como só ele sairá ganhando, foi cobrar a conta dos favores prestados aos amigos no poder.
(*) Jornalista e Ex-Diretor do Jornal do Brasil, do Jornal Gazeta Mercantil e Revista Forbes. Atualmente na Revista Veja.
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