Opinião do Estadão
Com a inclusão de emendas já vetadas pelo Executivo e de outras que asseguram isenções e outras vantagens tributárias para setores da economia nos quais seus autores têm interesse direto ou indireto, a Câmara dos Deputados conseguiu piorar uma medida provisória (MP) que, pela profusão e diversidade de temas tratados, já era ruim. Das várias dezenas de emendas apresentadas pelos deputados à Medida Provisória n.º 497, que estava em exame na Casa desde o dia 27 de julho, o relator, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), acatou 21. Assim, dos 32 artigos do texto proposto pelo governo, o projeto de conversão aprovado pela Câmara - e que agora será examinado pelo Senado - passou a ter 64 artigos, exatamente o dobro da versão original.
São tantos os assuntos tratados na MP, e ainda mais no texto aprovado pela Câmara, que é quase impossível resumir seu conteúdo. Originalmente, segundo o governo, a MP se destinava a desonerar as subvenções oficiais para a pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica e a instituir um regime especial de tributação para obras nos estádios de futebol para a Copa das Confederações de 2013 e a Copa do Mundo de 2014, além de "dar outras providências".
Já eram muitas as "outras providências" na MP original. Uma delas suspende a cobrança de tributos do importador que utilizar os bens estrangeiros para elaboração de produtos destinados ao mercado externo (draw back). Outra restabelece a cobrança de Imposto de Importação de autopeças. Há também um conjunto de mudanças nas normas de alfandegamento, para adaptá-las às regras internacionais. Outra "providência" estende o prazo para a concessão de incentivo tributário ao Programa Minha Casa, Minha Vida. Além de outras mudanças, a MP isenta o ganhador do leilão do trem-bala do pagamento do PIS/Cofins incidente sobre a receita com a venda de passagens.
Uma das emendas incorporadas à MP, de autoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), prevê que o Imposto de Renda e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) não incidirão sobre "a parcela equivalente à redução do valor das multas, juros e encargo legal" no caso do parcelamento de débitos administrados pelas autarquias e fundações públicas federais e débitos de qualquer natureza, tributários ou não, com a Procuradoria-Geral Federal.
Em maio, o Congresso havia incorporado uma emenda como essa ao texto da MP 472, mas o governo a vetou, alegando que, como o contribuinte que renegociou sua dívida já foi beneficiado com a redução a zero de multas e juros sobre o valor renegociado, não havia justificativa para a concessão de novo benefício, ou seja, a isenção tributária aprovada pelos parlamentares. Os congressistas tentam, novamente, criar essa vantagem adicional. Se for coerente, o governo deve vetá-la mais um vez.
Outra emenda que havia sido incorporada à MP 472 e foi vetada pelo governo, mas passou novamente pela Câmara, isenta de PIS/Pasep e Cofins as vendas de aves e suínos. Nos dois casos, o autor da emenda é o mesmo, o deputado Alfredo Kaefer (PSDB-PR), proprietário de empresas que estão entre as dez maiores do País nas áreas de frigorífico, abate de aves e de suínos.
Emenda do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) também incorporada ao texto aprovado pela Câmara suprime um artigo da MP original, que equipara, para fins de cobrança de PIS/Pasep e Cofins, atacadistas e fabricantes, quando houver interdependência entre eles. Segundo o governo, a equiparação evita que uma empresa produtora venda para sua coligada da área comercial, a preços subfaturados, bens tributados somente na produção, prática que reduz a base de cálculo do tributo.
Faria de Sá alega que a medida "penaliza todas as empresas de higiene pessoal e cosméticos", entre as quais, com certeza por mera coincidência, duas que contribuíram para financiar sua campanha. Outros deputados apoiaram a emenda com a alegação de que "não deve a Receita partir de hipotéticos casos de subfaturamento praticados por algumas empresas".
Se o Senado não derrubar essas emendas, caberá ao governo vetá-las.
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