segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Afinal, Lula, que * é essa?

Ricardo Noblat (*) 

Concorda com a frase ‘Na política nunca podemos dizer nunca’? 
Bem, eu concordo. E parto dela para compartilhar com vocês o que penso. 

Por exemplo: Sarney apoiou a ditadura militar de 1964 até à véspera de ela cair 21 anos depois. Então, rapidinho, passou para o lado dos que a combatiam. Entendeu? 
É confuso. Outro exemplo? Em 1989, Lula e Collor brigaram pela presidência da República. Collor ganhou chamando Lula de comunista. Lula perdeu chamando Collor de desonesto. Hoje, um apoia o outro. 
Último exemplo? 
Foi Lula quem fez Joaquim Barbosa ministro do Supremo Tribunal Federal. Os dois sempre estiveram do mesmo lado. 
No último sábado, sem citar o nome dele, Lula bateu duro em Joaquim. Acusou-o de ter condenado inocentes. Sugeriu que Joaquim será candidato a alguma coisa. 

Por que Lula procedeu assim? Porque o ministro Marco Aurélio Mello, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, contou à VEJA o que ouviu de Joaquim no final do ano passado. Em resumo, Joaquim disse que cansara. A experiência de ser ministro já estava de bom tamanho para ele. Desde então, segundo Marco Aurélio, “ventila-se” no Supremo Tribunal Federal (STF) que Joaquim será candidato à vaga de Dilma. 

(Contenha a euforia, Noblat!) 

Em 2005, estourou o escândalo do mensalão que quase derrubou o governo. 
Mensalão foi o nome dado ao esquema de compra de votos com dinheiro público para que Lula governasse. 

Nunca teve nome o esquema de compra de votos no Congresso que permitiu a reeleição de Fernando Henrique. 
Política é negócio. Um negócio milionário. Dê-me o que quero e lhe darei o que você quer. Nada sai de graça. 

Estou dando voltas porque escrevo cansado. Vamos adiante, todavia. 
Ameaçado pelo escândalo, Lula ocupou uma cadeia nacional de rádio e de televisão para pedir desculpas aos brasileiros, negar que existira mensalão e se dizer traído. Suas mãos tremiam. 

Mensalão? Jamais ouvira falar, disse. Corrigindo: ouvira uma vez, sim senhor. 
Foi quando recebeu em audiência o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), seu aliado. Mandou investigar o que Jefferson lhe contou. A investigação no Congresso durou uma semana. Nada foi descoberto. 

Lula ouviu falar do mensalão pela segunda vez quando visitou Goiás. 
O governador Marconi Perillo alertou-o para a compra do passe de deputados. E Lula? 
Na boa... Nem aí. 

Temeu-se depois que ele fosse capaz de se matar. Foi salvo pelo ministro José Dirceu. 
(Se gosto de Dirceu? Gosto sim, política à parte) 

Quanto aos traidores... 
Bem, Lula não apontou nomes de traidores. Afinal, como reclamar do julgamento daqueles que o traíram? Incoerência total. Falta de compromisso com a verdade. 
Nada que seja estranho à política cujas bases são a mentira, a fraude e a enganação.
Lula não parecia um político melhor nem pior do que qualquer outro. 
Era diferente apenas. Deixou de ser. 

Poderia ter dito com toda a clareza possível que seus traidores não foram esses que estão atrás das grades. E mais o que está preso na Itália. E nem os que estão dentro do STF. Seria a forma mais eficiente de defendê-los. Mas tal coisa seria o mesmo que admitir que o mensalão existiu. E que ele, Lula, de fato fora traído. 

O silêncio é a mais preciosa lei da máfia. E ele tem preço. Tanto no caso do traidor como no de quem se sente traído. 
Ensinam os manuais sobre traições: morra sem confessar. Se for o caso, valerá o preço de ir para o inferno mentindo. 

Que saudade de O Poderoso Chefão.

(*) Jornalista é responsável pelo Blog do Noblat do jornal O Globo 

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