quinta-feira, 28 de junho de 2012

O ministro e seu padrinho

O ministro pouparia as tripas do risco de enfarte se não tentasse contentar o padrinho  

Augusto Nunes (*)  

O ministro Ricardo Lewandowski demorou mais de seis meses para revisar o relatório de Joaquim Barbosa sobre o processo, iniciado há cinco anos, que trata de um escândalo ocorrido há sete. Em países sérios, o doutor teria entregado a encomenda na calada da noite e pela porta dos fundos, para não ter de explicar a lentidão inexplicável. Como estamos no Brasil, pendurou-se num palanque imaginário, caprichou na pose de magistrado exemplar e cumprimentou-se pela performance. 

“É o voto-revisor mais curto da história do Supremo Tribunal Federal”, fantasiou. “A média para um réu é de seis meses”. Se é assim, como registrou o comentário de 1 minuto para o site de VEJA, Lewandowski precisaria de 19 anos para resolver o que fazer com cada um dos 38 envolvidos. Para evitar que fosse decidido só em 2031 o destino dos pecadores sobreviventes, o ministro jura que andou trabalhando 20 horas por dia. 

Pelo menos não lhe faltou companhia, informa a folha de pagamento do Supremo. Além do chefe de gabinete, do recepcionista e de três agentes de segurança, a pequena multidão de funcionários subordinados ao ministro inclui pelo menos 17 analistas judiciários, 4 técnicos judiciários, 3 técnicos em secretariado, 1 procurador federal e 1 assistente administrativo. “Eu fiz das tripas coração para respeitar o que foi estabelecido pela Suprema Corte”, elogiou-se Lewandowski. 

Não fez mais que a obrigação ─ com um dia de atraso. E teria poupado as tripas do risco de enfarte se não tivesse esperado tanto tempo para colocar no papel o que está pronto na cabeça desde o dia em que chegou ao Supremo. “Nenhum ministro sofreu tantas pressões”, lamuriou-se. O presidente do STF, Ayres Britto, limitou-se a cobrar respeito ao cronograma combinado. Os brasileiros decentes limitaram-se a cobrar respeito à palavra empenhada. São cobranças legítimas. 

Nada a ver com as pressões criminosas feitas pelo padrinho Lula. No começo do ano, como revelou na desastrada conversa com o ministro Gilmar Mendes, o ex-presidente que se acha inimputável visitou o afilhado no condomínio em São Bernardo para pedir-lhe que retardasse o julgamento do mensalão até 2013. Ou, se possível, até o século 22. A reação do país que presta e as ponderações dos colegas menos insensatos dissuadiram Lewandowski de atender ao pedido. 

Terá de esperar a hora da votação para mostrar que sabe ser grato. Como sabe até o cabide em que pendura a toga, o ministro vai absolver os peixes graúdos ─ “por falta de provas” ─ e distribuir castigos de mãe entre meia dúzia de alevinos. Isso se sentir a faca roçando o pescoço. Caso lhe pareça segura a distância que separa a sede do STF do mundo real, poderá até decretar a absolvição póstuma de José Janene. 

E talvez se anime a proclamar a inocência do Silvio Pereira, fixando em seguida a indenização que o Estado tem de pagar ao ex-secretário geral do PT. Mensaleiro juramentado, Silvinho Land Rover se submeteu a um período de trabalhos comunitários em troca da exclusão do processo. O que torna o caso especialmente intrigante é que foi o acusado quem propôs o acordo. Se os parceiros de quadrilha escaparem por falta de provas, Silvinho terá purgado pecados que não cometeu. Aliás, nem existiram. 

Nessa hipótese, o mundo será apresentado à mais recente maravilha da fauna brasileira: a vítima voluntária de um grave erro judicial. 

(*) Jornalista e Ex-Diretor do Jornal do Brasil, do Jornal Gazeta Mercantil e Revista Forbes. Atualmente na Revista Veja

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