sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Saldos do Fim do Ano


Murillo de Aragão (*)
Nunca antes na história deste país um governo foi tão mal interpretado por conta de suas virtudes e defeitos.

Pouco se aproveita da mistura de sentimentos e opiniões sobre o governo Lula. Quem elogia, é vendido. Quem critica, oposição. Não é bem assim.
É muito mais complicado. Um pouco de reflexão sobre o que foi o seu governo é mais do que necessário.
Vamos partir de três áreas: economia, política e sociedade e verificar o paradoxo em que vivemos.

Para o horror daqueles que odeiam Lula e o PT, o Brasil de 2010 – com seus graves defeitos - é bem melhor do que o Brasil de 2002, por exemplo.
Vale ressaltar que os avanços de FHC pavimentaram o caminho do sucesso de Lula. No entanto, tal qual em Copa do Mundo, o que vale é o resultado.
Os índices de desenvolvimento social melhoraram significativamente: consumo de calorias, aumento de renda real, redução da pobreza, entre outros.
O aumento real do salário mínimo é outra proeza incrível já que, por muitas décadas, dizia-se que o aumento do salário mínimo causaria inflação e quebraria os municípios. Nada aconteceu.

No campo econômico, os índices da era Lula também são admiráveis. Lula teve o bom senso de evitar ser tragado por maus conselhos, mesmo que cheios de boas intenções.
O que muitas vezes é fatal em matéria de política econômica.
Ao final de sua era, Lula vai ostentar números robustos em termos de aumento de renda, reservas internacionais, queda na taxa de juros e, sobretudo, expansão do crédito, entre outros.

No campo político, os resultados são mais do que decepcionantes: nenhuma reforma constitucional significativa foi aprovada, fora um ensaio de reforma previdenciária lá em 2003.
O presidente, mesmo contando com índices altíssimos de popularidade, não conseguiu mobilizar o Congresso para aprovar reformas importantes capazes de aperfeiçoar o país.
Alguns temas, como o cadastro positivo e a lei das agências reguladoras andam a passos de jabuti no Congresso.

A reforma política é feita em fatias, como a maquiagem feita recentemente na lei eleitoral. Alguns podem dizer que o governo não tem culpa. Não é verdade.
Poderia ter feito mais pela reforma política caso o presidente jogasse seu peso popular na questão. Como não ocorreu nem uma nem outra situação, a reforma ficará para as calendas.
O governo Lula, assim como FHC, também abusou das medidas provisórias agravando a fragilidade institucional e o clientelismo do Congresso.

Apenas em 2009, a farra das medidas provisórias arrefeceu.
Outro fato terrível foi a seqüência de escândalos políticos. A começar pelo triste “mensalão”, que alguns insistem em desmentir.
Depois veio o escândalo dos aloprados, os escândalos do Senado e, por fim, o mensalão candango que revelou a pocilga da provinciana política local da capital federal.

Lula, tal qual foi FHC, Castello Branco, JK e Vargas, se insere no patamar dos maiores e melhores presidentes da história do Brasil, não apenas pelas suas virtudes e defeitos, mas pela capacidade de saber lidar com os seus limites e explorar o terreno que lhe coube da melhor maneira.
Mesmo que pudesse ter feito ainda mais. Mas nenhum deles soube livrar a sociedade do jugo da política menor e do clientelismo ainda que, sem dúvida, tenham ocorrido avanços.

Lula, a seu favor, além dos evidentes ganhos sociais e econômicos, pelo menos não caiu em tentação na busca pelo terceiro mandato em seqüência, como alguns defendiam.
O paradoxo mencionado no início fica claro quando veremos um Brasil decolar para mais um ciclo de crescimento econômico sem ter feito, na medida necessária, os devidos reparos e aperfeiçoamentos institucionais que necessitamos.

É como um avião com potentes motores e aviônicos de segunda. No futuro, tudo pode ir mais ou menos bem. Ou nem tanto.

(*) É cientista político


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