Padre Edilberto Sena (*)
No passado mais distante era coronel de barranco o velho Zé Júlio. Ele reinava soberano nas terras da jarilândia, município de Almeirim, no Estado do Pará, escravizando caboclos ribeirinhos na região. Dizia o coronel Zé Júlio que todo aquele latifúndio sem fim era dele e os moradores deviam comprar e vender tudo através do barracão do próprio. Os ribeirinhos nunca tinham saldo em suas transações com o barracão. Exploravam castanha, resinas, borracha e madeira.
Após sua morte, os filhos do coronel Zé Júlio venderam o latifúndio sem fim ao milionário gringo Daniel Ludwig, que sonhou criar um império de exploração de, uma mina de caulim, criação de gado, cultivo de arroz em escala e principalmente com um fábrica de celulose. Fez vultoso investimento, com aval do tesouro brasileiro e cobertura da ditadura militar de então. Quando o bilionário gringo desistiu de seu louco projeto, deixou tudo, projeto falido, dívidas com fornecedores, tudo ficou por conta do tesouro nacional.
Desde então, empresas nacionais fizeram rodízio de ocupação do que podia ser aproveitado, ficando a dívida para o governo brasileiro. Hoje um grupo empresarial do sul controla as riquezas deixadas pelo dono anterior: mina de caulim, fábrica de celulose e um imenso latifúndio inconstitucional, menos a dívida do tesouro nacional. Dizem eles que sua propriedade é de um milhão de hectares. Tamanha propriedade é controversa. Em parte dela habitam centenas de famílias de descendentes de explorados do antigo coronel Zé Júlio e outras um pouco mais recente, mas anterior ao grupo que hoje explora as riquezas das terras da Jarilândia.
A empresa Jari Celulose alega ser dona do latifúndio e por isso, expulsa ribeirinhos, ameaça os mais resistentes. Interessa à empresa derrubar floresta e plantar monocultura de eucalipto para produzir celulose. Os ribeirinhos tradicionais são descartáveis. Uma série de crimes está ocorrendo naquela região: crimes ambientais com a derrubada indiscriminada de floresta para plantio de eucalipto; crime social, com a tentativa de expulsar centenas de família que habitam secularmente a região ambicionada pela empresa oportunista; e crime constitucional por alegar ser proprietária de um milhão de hectares de terra, quando a constituição brasileira não permite tal absurdo.
Tais crimes estão sendo denunciados por um grupo de moradores ribeirinhos ameaçados pela empresa que estiveram há poucos dias em Santarém e procuram proteção da justiça. Até agora o governo brasileiro, como no tempo do coronel Zé Júlio, e no tempo do estrangeiro Daniel Ludwig, dá amparo ao capitalista e ignora centenas de ribeirinhos tradicionais, filhos legítimos da Amazônia. A única esperança é o Ministério Público Federal assumir as dores dos prejudicados. Quanto à dívida deixada pelo gringo Daniel Ludwig, não se sabe se o tesouro brasileiro já pagou, ou se ainda faz parte da dívida pública que o país tem pendurada. Este é o Brasil que faz da Amazônia uma colônia de exploração das riquezas e desprezo pelos seus habitantes.
(*) Sacerdote e Diretor da Rádio Rural de Santarém (PA)
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