Denis Lerrer Rosenfield (*)
A criatividade de nossos legisladores e, no caso, de nossos prefeitos parece não ter limites. A sua engenhosidade é tal que partem para a criação de novas formas de tributações, como se o interesse público se resumisse ao que é melhor para eles, e não para os consumidores deste país.
É sabido que a carta tributária já se situa acima do razoável, com os cidadãos sentindo na carne — e na mesa — os efeitos de impostos que oneram a renda familiar. Progressivamente, esses mesmos cidadãos começam a perceber que impostos e tributos são nada mais do que transferências de renda e de bens em geral.
Na verdade, uma família, por exemplo, transfere uma parte dos seus bens para o Estado, em suas várias instâncias, da municipal para a federal, passando pela estadual e pelas diferentes instâncias do Legislativo e do Judiciário.
Não deixa, portanto, de causar espécie o projeto de lei do Senado (PLS) complementar nº 386, de 2012, do senador Romero Jucá, que dispõe sobre o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza — ISS, de competência dos municípios e do Distrito Federal.
Com efeito, ele dispõe sobre a tributação da “locação empresarial”, incidindo, entre outros setores, sobre empresas familiares (que vivem de sua renda), escritórios comerciais, pontos comerciais de shopping centers, áreas residenciais alugadas a empresas, inquilinos residenciais que tenham como locadores pessoas jurídicas, entre outros.
Trata-se de uma transformação do mercado de locação empresarial, com reflexos evidentes sobre os preços dos aluguéis pagos pelos inquilinos. Note-se que o aumento de impostos tende a ser repassado ao preço, com o locatário arcando com o seu ônus.
Na iniciativa desse PLS encontram-se os secretários de Finanças das capitais e a Frente Nacional dos Prefeitos. Se, de um lado, é compreensível que os prefeitos procurem aumentar a sua receita, vistas as obrigações que devem cumprir, de outro lado é incompreensível que os contribuintes devam arcar com isto, e não mediante uma redistribuição entre os diferentes entes federativos.
Dentre os motivos de elaboração do projeto de lei, cumpre destacar que ele “visa a diminuir a dependência dos municípios em relação às transferências constitucionais, em especial, o Fundo de Participação dos Municípios e as transferências relativas ao ICMS e ao IPVA”.
Ou seja, os municípios procuram uma maior independência financeira à custa de tornarem os cidadãos mais dependentes do Estado, devendo eles arcar com uma carga maior de seu funcionamento.
Em linguagem popular, o contribuinte deveria “pagar o pato” do fato de os prefeitos não conseguirem se entender com os estados e a União. Um “terceiro”, o cidadão, deveria arcar com uma má distribuição dos entes federativos entre si.
Parece ser mais fácil descarregar o problema sobre alguém que se encontra em uma condição passiva, devendo apenas “aceitar” uma solução “legislativa”. O bem de todos é lesado por uma suposta e bizarra noção de “bem público”, isto é, o deles!
Observe-se que essa iniciativa “legislativa” insere-se em um contexto político de regulamentação e de aplicação da Lei de Transparência dos Impostos, lei 12.741, obrigando as notas fiscais a discriminarem, nos preços, os impostos e serviços neles embutidos.
A lei foi elaborada a partir de uma iniciativa louvável da Associação Comercial de São Paulo, que, com a utilização do seu “impostômetro”, contribuiu decisivamente para que a sociedade paulista e brasileira se conscientizassem daquilo que pagam ao Estado cotidianamente.
Ora, esse contexto é bem o de uma conscientização do peso da carga tributária na vida de cada um. O que é visado consiste em uma redução de impostos e contribuições e em um melhor equacionamento e proporcionalidade entre o que os cidadãos pagam ao Estado e o que dele recebem em serviços como segurança, saúde, educação e saneamento, entre outros.
Forçoso é reconhecer que o projeto de lei 386 situa-se na contramão dessa tendência brasileira. Convém ainda salientar que sobre os dividendos oriundos da locação já incidem o Imposto de Renda, as cobranças de PIS e Cofins, além de os inquilinos pagarem IPTU. Seria mais uma tributação a se inserir nessa lista suficientemente pesada.
Quem arca com esse peso? O inquilino e o cidadão em geral, sobre cujos ombros se ergue toda a estrutura estatal. É muito peso para pouco suporte!
Além desse impacto sociopolítico há de se considerar o impacto econômico, pois as locações empresariais de bens imóveis fazem parte de uma longa cadeia produtiva, ela mesma geradora de impostos, emprego e investimentos crescentes.
Novas moradias postas em aluguel, mercado de escritórios, ampliação e construção de novos shopping-centers, não são frutos do acaso, mas nascem da segurança jurídica e de condições propícias aos negócios. Certamente tal ambiente não se coaduna com carga tributária crescente!
Na verdade, os municípios são os maiores beneficiários de novos investimentos. Quanto maior for o número de moradias postas em locação, quanto maior for o número de shopping centers, quando maior for o número de escritórios oferecidos, quanto maior for o número de famílias que se organizarem empresarialmente para usufruírem dos seus imóveis, maiores serão os ganhos dos municípios.
Com essa nova forma aleatória de tributação municipal, os investimentos serão afetados, tanto do ponto de vista nacional, quanto internacional. Fundos de pensão, fundos imobiliários, investidores em geral, construtoras nacionais, incorporadoras e desenvolvedores de shoppings terão um impacto imediato em suas atividades e projeções.
Imaginem um ambiente de aumento do valor de locações de imóveis, residenciais e comerciais, e pontos comerciais em shopping centers. Produtos mais caros serão vendidos e os consumidores serão aqueles que deverão pagar mais por aquilo que custava menos há apenas algumas semanas.
A percepção de aumento de impostos, inevitavelmente, não será positiva para os administradores municipais.
(*) Professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
A criatividade de nossos legisladores e, no caso, de nossos prefeitos parece não ter limites. A sua engenhosidade é tal que partem para a criação de novas formas de tributações, como se o interesse público se resumisse ao que é melhor para eles, e não para os consumidores deste país.
É sabido que a carta tributária já se situa acima do razoável, com os cidadãos sentindo na carne — e na mesa — os efeitos de impostos que oneram a renda familiar. Progressivamente, esses mesmos cidadãos começam a perceber que impostos e tributos são nada mais do que transferências de renda e de bens em geral.
Na verdade, uma família, por exemplo, transfere uma parte dos seus bens para o Estado, em suas várias instâncias, da municipal para a federal, passando pela estadual e pelas diferentes instâncias do Legislativo e do Judiciário.
Não deixa, portanto, de causar espécie o projeto de lei do Senado (PLS) complementar nº 386, de 2012, do senador Romero Jucá, que dispõe sobre o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza — ISS, de competência dos municípios e do Distrito Federal.
Com efeito, ele dispõe sobre a tributação da “locação empresarial”, incidindo, entre outros setores, sobre empresas familiares (que vivem de sua renda), escritórios comerciais, pontos comerciais de shopping centers, áreas residenciais alugadas a empresas, inquilinos residenciais que tenham como locadores pessoas jurídicas, entre outros.
Trata-se de uma transformação do mercado de locação empresarial, com reflexos evidentes sobre os preços dos aluguéis pagos pelos inquilinos. Note-se que o aumento de impostos tende a ser repassado ao preço, com o locatário arcando com o seu ônus.
Na iniciativa desse PLS encontram-se os secretários de Finanças das capitais e a Frente Nacional dos Prefeitos. Se, de um lado, é compreensível que os prefeitos procurem aumentar a sua receita, vistas as obrigações que devem cumprir, de outro lado é incompreensível que os contribuintes devam arcar com isto, e não mediante uma redistribuição entre os diferentes entes federativos.
Dentre os motivos de elaboração do projeto de lei, cumpre destacar que ele “visa a diminuir a dependência dos municípios em relação às transferências constitucionais, em especial, o Fundo de Participação dos Municípios e as transferências relativas ao ICMS e ao IPVA”.
Ou seja, os municípios procuram uma maior independência financeira à custa de tornarem os cidadãos mais dependentes do Estado, devendo eles arcar com uma carga maior de seu funcionamento.
Em linguagem popular, o contribuinte deveria “pagar o pato” do fato de os prefeitos não conseguirem se entender com os estados e a União. Um “terceiro”, o cidadão, deveria arcar com uma má distribuição dos entes federativos entre si.
Parece ser mais fácil descarregar o problema sobre alguém que se encontra em uma condição passiva, devendo apenas “aceitar” uma solução “legislativa”. O bem de todos é lesado por uma suposta e bizarra noção de “bem público”, isto é, o deles!
Observe-se que essa iniciativa “legislativa” insere-se em um contexto político de regulamentação e de aplicação da Lei de Transparência dos Impostos, lei 12.741, obrigando as notas fiscais a discriminarem, nos preços, os impostos e serviços neles embutidos.
A lei foi elaborada a partir de uma iniciativa louvável da Associação Comercial de São Paulo, que, com a utilização do seu “impostômetro”, contribuiu decisivamente para que a sociedade paulista e brasileira se conscientizassem daquilo que pagam ao Estado cotidianamente.
Ora, esse contexto é bem o de uma conscientização do peso da carga tributária na vida de cada um. O que é visado consiste em uma redução de impostos e contribuições e em um melhor equacionamento e proporcionalidade entre o que os cidadãos pagam ao Estado e o que dele recebem em serviços como segurança, saúde, educação e saneamento, entre outros.
Forçoso é reconhecer que o projeto de lei 386 situa-se na contramão dessa tendência brasileira. Convém ainda salientar que sobre os dividendos oriundos da locação já incidem o Imposto de Renda, as cobranças de PIS e Cofins, além de os inquilinos pagarem IPTU. Seria mais uma tributação a se inserir nessa lista suficientemente pesada.
Quem arca com esse peso? O inquilino e o cidadão em geral, sobre cujos ombros se ergue toda a estrutura estatal. É muito peso para pouco suporte!
Além desse impacto sociopolítico há de se considerar o impacto econômico, pois as locações empresariais de bens imóveis fazem parte de uma longa cadeia produtiva, ela mesma geradora de impostos, emprego e investimentos crescentes.
Novas moradias postas em aluguel, mercado de escritórios, ampliação e construção de novos shopping-centers, não são frutos do acaso, mas nascem da segurança jurídica e de condições propícias aos negócios. Certamente tal ambiente não se coaduna com carga tributária crescente!
Na verdade, os municípios são os maiores beneficiários de novos investimentos. Quanto maior for o número de moradias postas em locação, quanto maior for o número de shopping centers, quando maior for o número de escritórios oferecidos, quanto maior for o número de famílias que se organizarem empresarialmente para usufruírem dos seus imóveis, maiores serão os ganhos dos municípios.
Com essa nova forma aleatória de tributação municipal, os investimentos serão afetados, tanto do ponto de vista nacional, quanto internacional. Fundos de pensão, fundos imobiliários, investidores em geral, construtoras nacionais, incorporadoras e desenvolvedores de shoppings terão um impacto imediato em suas atividades e projeções.
Imaginem um ambiente de aumento do valor de locações de imóveis, residenciais e comerciais, e pontos comerciais em shopping centers. Produtos mais caros serão vendidos e os consumidores serão aqueles que deverão pagar mais por aquilo que custava menos há apenas algumas semanas.
A percepção de aumento de impostos, inevitavelmente, não será positiva para os administradores municipais.
(*) Professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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