Cláudio de Moura Castro (*)
Afirmou categoricamente o diretor de uma das melhores escolas de Desenho Industrial, na Suíça: "Aqui não temos profissionais do ensino. O que temos são profissionais que ensinam". Na escola de artes plásticas da Corcoran Gallery, em Washington, apenas artistas com ateliês estabelecidos e operando comercialmente podem candidatar-se para as posições docentes. O novo diretor do Media Lab do MIT nem sequer tem curso de graduação!
Nas boas universidades do mundo, é consagrada a prática de usar acadêmicos para ensinar nas áreas científicas e nas humanidades. Em contraste, as disciplinas profissionais devem ser ensinadas por profissionais.
Nas nossas terras, Érico Veríssimo só conseguiu ser professor de Literatura nos Estados Unidos, pois não tinha os diplomas exigidos aqui. Jacques Klein nunca foi convidado para ensinar piano em nenhuma universidade, pois, apesar de ser o maior pianista brasileiro, tampouco tinha os diplomas. Se Pelé fosse professor de futebol, o curso dele seria penalizado na avaliação, pois só tem o bacharelado.
Numa época em que quase não havia pós-graduação e, portanto, nem mestres nem doutores, fazia muito sentido criar incentivos robustos para estimular instituições e futuros professores a investirem em diplomas pós-graduados.
Mas é a velha história do pêndulo. Ora vai demais para um lado, ora volta para o outro. No momento, atingimos um paroxismo de diplomite. Esquecemos que diploma é um recibo de conhecimento, mas não pode virar o monopólio do saber. Mais ainda, há áreas em que o conhecimento não está nos diplomas, mas na experiência vivida no local de trabalho. Nelas, exigir diploma é quase uma garantia de falta do conhecimento prático que é o cerne do desempenho. De fato, sendo jovem a pós-graduação, não houve tempo para que muitos mestres e doutores adquirissem conhecimentos práticos. Com o regime de dedicação exclusiva, só podem adquiri-la se, ao longo da carreira docente, contrariarem a lei.
É hora de empurrar o pêndulo de volta para o centro. O folclore universitário está recheado de casos grotescos de profissionais consagrados substituídos por jovens doutores sem quaisquer distinções, além do diploma. Faz tempo, substituíram um professor com um reles bacharelado por um recém-doutor. A se notar, defenestraram o grande arquiteto Sérgio Bernardes.
Nunca aponho letrinhas ao meu nome, mas abro exceção, para demonstrar que não advogo em causa própria.
Como se contrapor ao furor e à máfia dos diplomados? O conserto é simples: Enquadram-se como equivalentes a especialista, mestre ou doutor pessoas com experiência profissional apropriada e ensinando aquelas disciplinas profissionais que correspondem a ela. Por exemplo, um compositor, um arquiteto, um advogado e um engenheiro que trabalham na área que ensinam deverão ser classificados como especialistas, mestres ou doutores. Isso, para efeitos de credenciamento, de salários ou de ocupar posições administrativas no departamento.
Igualmente necessário é que o MEC reajuste as suas avaliações, seja da graduação ou da pós-graduação. Hoje, as instituições são punidas com notas mais baixas por contratarem quem tem experiência, em vez de doutores que jamais trabalharam no assunto do curso. Sem mudar esse critério perverso, nada feito.
É inevitável que um profissional requisitado e valorizado no mercado seja um professor horista. Portanto, as avaliações não devem penalizar a instituição que contrata profissionais experientes nesse regime. Nessas disciplinas, valem mais algumas horas de aula do engenheiro consagrado do que o tempo integral do jovem doutor que jamais fez um projeto de verdade.
Atualmente, um professor sem pós-graduação ensinando Cálculo 1 penaliza a avaliação do curso. O certo é que um doutor sem experiência na sua disciplina profissionalizante deveria também reduzir a nota.
Não estou propondo a criação de um enquadramento honoris causa ou notório saber, por envolver um rito pesado, já que são critérios de exceção. Aqui tratamos de regras que deveriam ser comuns e correntes para muitas disciplinas.
Sugiro tratar como equivalentes ao de um pós-graduado os profissionais que têm experiência de trabalho na área da disciplina. Deve enquadrar-se como pós-graduado um engenheiro de sistemas, trabalhando na IBM, em redes de computação e ensinando esse mesmo assunto. Um compositor consagrado poderá ser considerado equivalente a um doutor.
Um engenheiro siderúrgico da Usiminas teria uma experiência profissional superior em densidade tecnológica à do encarregado de um alto forno em Itaúna. Um engenheiro da Microsoft seria mais experiente em sistemas operacionais do que alguém que trabalha na informática da prefeitura. O repertório técnico de um cardiologista do Einstein é mais amplo do que o de um médico que trabalha num hospital do interior.
Como sugestão, cinco anos de experiência na área do curso a ser ensinado seriam o mínimo para uma equivalência a mestre ou especialista. Para equivalência a doutor, pelo menos dez anos. Quanto mais sofisticado ou complexo o trabalho na empresa, mais elevada a equivalência. Quanto mais denso o nível tecnológico da empresa, mais alta seria a competência do candidato.
Esse enquadramento seria feito por comissões tripartites, formadas de profissionais da área, acadêmicos e representantes de empresas. Seria mais prático que as próprias Instituições de Ensino Superior (IES) tivessem suas comissões, fazendo o enquadramento do candidato e justificando o seu parecer. Caberia ao MEC apenas ratificar as recomendações.
Não há razões para crer que o ensino privado tenha interesse em inflacionar o currículo de algum professor, pois, quanto mais alto o classificarem, mais terão de pagar. E profissionais consagrados na área não são mais baratos do que jovens doutores.
(*) Cláudio de Moura Castro , M.A., PH.D., é Pesquisador em Educação
Afirmou categoricamente o diretor de uma das melhores escolas de Desenho Industrial, na Suíça: "Aqui não temos profissionais do ensino. O que temos são profissionais que ensinam". Na escola de artes plásticas da Corcoran Gallery, em Washington, apenas artistas com ateliês estabelecidos e operando comercialmente podem candidatar-se para as posições docentes. O novo diretor do Media Lab do MIT nem sequer tem curso de graduação!
Nas boas universidades do mundo, é consagrada a prática de usar acadêmicos para ensinar nas áreas científicas e nas humanidades. Em contraste, as disciplinas profissionais devem ser ensinadas por profissionais.
Nas nossas terras, Érico Veríssimo só conseguiu ser professor de Literatura nos Estados Unidos, pois não tinha os diplomas exigidos aqui. Jacques Klein nunca foi convidado para ensinar piano em nenhuma universidade, pois, apesar de ser o maior pianista brasileiro, tampouco tinha os diplomas. Se Pelé fosse professor de futebol, o curso dele seria penalizado na avaliação, pois só tem o bacharelado.
Numa época em que quase não havia pós-graduação e, portanto, nem mestres nem doutores, fazia muito sentido criar incentivos robustos para estimular instituições e futuros professores a investirem em diplomas pós-graduados.
Mas é a velha história do pêndulo. Ora vai demais para um lado, ora volta para o outro. No momento, atingimos um paroxismo de diplomite. Esquecemos que diploma é um recibo de conhecimento, mas não pode virar o monopólio do saber. Mais ainda, há áreas em que o conhecimento não está nos diplomas, mas na experiência vivida no local de trabalho. Nelas, exigir diploma é quase uma garantia de falta do conhecimento prático que é o cerne do desempenho. De fato, sendo jovem a pós-graduação, não houve tempo para que muitos mestres e doutores adquirissem conhecimentos práticos. Com o regime de dedicação exclusiva, só podem adquiri-la se, ao longo da carreira docente, contrariarem a lei.
É hora de empurrar o pêndulo de volta para o centro. O folclore universitário está recheado de casos grotescos de profissionais consagrados substituídos por jovens doutores sem quaisquer distinções, além do diploma. Faz tempo, substituíram um professor com um reles bacharelado por um recém-doutor. A se notar, defenestraram o grande arquiteto Sérgio Bernardes.
Nunca aponho letrinhas ao meu nome, mas abro exceção, para demonstrar que não advogo em causa própria.
Como se contrapor ao furor e à máfia dos diplomados? O conserto é simples: Enquadram-se como equivalentes a especialista, mestre ou doutor pessoas com experiência profissional apropriada e ensinando aquelas disciplinas profissionais que correspondem a ela. Por exemplo, um compositor, um arquiteto, um advogado e um engenheiro que trabalham na área que ensinam deverão ser classificados como especialistas, mestres ou doutores. Isso, para efeitos de credenciamento, de salários ou de ocupar posições administrativas no departamento.
Igualmente necessário é que o MEC reajuste as suas avaliações, seja da graduação ou da pós-graduação. Hoje, as instituições são punidas com notas mais baixas por contratarem quem tem experiência, em vez de doutores que jamais trabalharam no assunto do curso. Sem mudar esse critério perverso, nada feito.
É inevitável que um profissional requisitado e valorizado no mercado seja um professor horista. Portanto, as avaliações não devem penalizar a instituição que contrata profissionais experientes nesse regime. Nessas disciplinas, valem mais algumas horas de aula do engenheiro consagrado do que o tempo integral do jovem doutor que jamais fez um projeto de verdade.
Atualmente, um professor sem pós-graduação ensinando Cálculo 1 penaliza a avaliação do curso. O certo é que um doutor sem experiência na sua disciplina profissionalizante deveria também reduzir a nota.
Não estou propondo a criação de um enquadramento honoris causa ou notório saber, por envolver um rito pesado, já que são critérios de exceção. Aqui tratamos de regras que deveriam ser comuns e correntes para muitas disciplinas.
Sugiro tratar como equivalentes ao de um pós-graduado os profissionais que têm experiência de trabalho na área da disciplina. Deve enquadrar-se como pós-graduado um engenheiro de sistemas, trabalhando na IBM, em redes de computação e ensinando esse mesmo assunto. Um compositor consagrado poderá ser considerado equivalente a um doutor.
Um engenheiro siderúrgico da Usiminas teria uma experiência profissional superior em densidade tecnológica à do encarregado de um alto forno em Itaúna. Um engenheiro da Microsoft seria mais experiente em sistemas operacionais do que alguém que trabalha na informática da prefeitura. O repertório técnico de um cardiologista do Einstein é mais amplo do que o de um médico que trabalha num hospital do interior.
Como sugestão, cinco anos de experiência na área do curso a ser ensinado seriam o mínimo para uma equivalência a mestre ou especialista. Para equivalência a doutor, pelo menos dez anos. Quanto mais sofisticado ou complexo o trabalho na empresa, mais elevada a equivalência. Quanto mais denso o nível tecnológico da empresa, mais alta seria a competência do candidato.
Esse enquadramento seria feito por comissões tripartites, formadas de profissionais da área, acadêmicos e representantes de empresas. Seria mais prático que as próprias Instituições de Ensino Superior (IES) tivessem suas comissões, fazendo o enquadramento do candidato e justificando o seu parecer. Caberia ao MEC apenas ratificar as recomendações.
Não há razões para crer que o ensino privado tenha interesse em inflacionar o currículo de algum professor, pois, quanto mais alto o classificarem, mais terão de pagar. E profissionais consagrados na área não são mais baratos do que jovens doutores.
(*) Cláudio de Moura Castro , M.A., PH.D., é Pesquisador em Educação
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