Eliane Cantanhêde (*)
O Brasil tem agora o antes e depois de 15 de março de 2015. Mais de um milhão de pessoas foram às ruas para protestar contra a presidente Dilma Rousseff e contra o PT, que, desde 1980, era quem tinha força e capacidade de mobilização.
Quem poderia imaginar que o PT mudaria de lado e passaria a ser alvo, após 30 anos de glórias e de jogar as ruas contra tudo e contra todos em nome da ética?
Bastaram 12 anos de poder para o caçador virar caça. E isso tem um lado dramático.
Mas cada um colhe o que plantou.
À crise política, aos erros na economia, aos desmandos éticos, ao desmanche da Petrobras, soma-se o último fator que faltava: as ruas.
Fecha-se o cerco. Não foi uma manifestação a mais, foi uma para entrar na história, tal a dimensão e a extensão.
Em junho de 2013, a classe média assalariada explodiu nas ruas com uma pauta difusa – e confusa – de reivindicações e de acusações generalizadas contra “tudo o que está aí”.
Já neste 15 de março de 2015, jovens e velhos, mulheres e homens, empresários e assalariados tiveram uma pauta bastante específica: a rejeição a Dilma, ao governo e ao PT.
Registre-se uma grande ausência: a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não apareceu na sexta-feira nem no domingo, fosse para aprovar ou desaprovar qualquer dos dois movimentos. Mas o pior não foi isso: as multidões, com seus cartazes e slogans, simplesmente ignoraram Lula. Será que Lula, para o bem e para o mal, também não é mais o mesmo?
Do outro lado, a palavra impeachment, que foi o mote original da convocação pelas redes sociais, foi perdendo apelo e se enfraquecendo ao longo do processo e praticamente desapareceu no dia “D”. O “Fora Dilma” é simbólico. O pedido de impeachment, bem mais concreto, sumiu.
Tudo isso desaba sobre o PT num momento em que Dilma despenca nas pesquisas de opinião em todas as faixas e em todas as regiões e em que o governo deixa de ser um trunfo do partido para se transformar num fardo político.
Por quê?
Porque não tem o que dizer, não tem o que apresentar, não tem um horizonte melhor a oferecer.
Diz a regra que, se você não tem o que dizer, é melhor ficar calado.
Dilma quebrou essa regra no Dia Internacional da Mulher e ontem destacou os ministros José Eduardo Cardozo e Miguel Rossetto para responder à avalanche popular com os dois temas sacados em junho de 2013: reforma política e pacote anticorrupção.
Dois anos depois, é tudo o que o governo tem a dizer?
Como “defesa”, os ministros disseram que quem foi às ruas não foi o eleitor de Dilma, foi o eleitor de oposição. Isso escamoteia o desgaste real e perceptível da presidente recém-reeleita; é uma admissão de que a oposição está cada vez mais forte e mais organizada e confirma que o governo, incapaz de fazer alguma autocrítica, continua autista, isolado, talvez incapaz de ouvir a voz rouca das ruas. Pior: foi para o confronto e perdeu.
O governo, via PT, CUT e UNE, pagou para ver e deu no que deu. Os atos de sexta-feira, organizados, foram relevantes, mas os protestos de ontem, espontâneos, mostraram que os irritados com o governo ultrapassam em muito os aliados do PT.
É hora de o governo lamber as feridas e de a oposição avaliar seriamente como entrar no vácuo das manifestações. Espera-se que Dilma passe a ouvir, a conversar, a ceder, mas isso é querer que Dilma deixe de ser Dilma. Espera-se que o governo recomponha uma economia esgarçada e recupere a capacidade de articulação política com o Congresso, mas é preciso combinar com o PMDB.
E da oposição, o que se espera? Aí está o x do problema. As manifestações foram contra o PT, mas não foram a favor da oposição. O PSDB parece não saber o que dizer, o que fazer e para onde ir, está sem rumo e a reboque das ruas.
E isso leva a um diagnóstico bastante grave: a crise é gigantesca, mas sem saída.
(*) Jornalista é colunista da Folha de São Paulo
O Brasil tem agora o antes e depois de 15 de março de 2015. Mais de um milhão de pessoas foram às ruas para protestar contra a presidente Dilma Rousseff e contra o PT, que, desde 1980, era quem tinha força e capacidade de mobilização.
Quem poderia imaginar que o PT mudaria de lado e passaria a ser alvo, após 30 anos de glórias e de jogar as ruas contra tudo e contra todos em nome da ética?
Bastaram 12 anos de poder para o caçador virar caça. E isso tem um lado dramático.
Mas cada um colhe o que plantou.
À crise política, aos erros na economia, aos desmandos éticos, ao desmanche da Petrobras, soma-se o último fator que faltava: as ruas.
Fecha-se o cerco. Não foi uma manifestação a mais, foi uma para entrar na história, tal a dimensão e a extensão.
Em junho de 2013, a classe média assalariada explodiu nas ruas com uma pauta difusa – e confusa – de reivindicações e de acusações generalizadas contra “tudo o que está aí”.
Já neste 15 de março de 2015, jovens e velhos, mulheres e homens, empresários e assalariados tiveram uma pauta bastante específica: a rejeição a Dilma, ao governo e ao PT.
Registre-se uma grande ausência: a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não apareceu na sexta-feira nem no domingo, fosse para aprovar ou desaprovar qualquer dos dois movimentos. Mas o pior não foi isso: as multidões, com seus cartazes e slogans, simplesmente ignoraram Lula. Será que Lula, para o bem e para o mal, também não é mais o mesmo?
Do outro lado, a palavra impeachment, que foi o mote original da convocação pelas redes sociais, foi perdendo apelo e se enfraquecendo ao longo do processo e praticamente desapareceu no dia “D”. O “Fora Dilma” é simbólico. O pedido de impeachment, bem mais concreto, sumiu.
Tudo isso desaba sobre o PT num momento em que Dilma despenca nas pesquisas de opinião em todas as faixas e em todas as regiões e em que o governo deixa de ser um trunfo do partido para se transformar num fardo político.
Por quê?
Porque não tem o que dizer, não tem o que apresentar, não tem um horizonte melhor a oferecer.
Diz a regra que, se você não tem o que dizer, é melhor ficar calado.
Dilma quebrou essa regra no Dia Internacional da Mulher e ontem destacou os ministros José Eduardo Cardozo e Miguel Rossetto para responder à avalanche popular com os dois temas sacados em junho de 2013: reforma política e pacote anticorrupção.
Dois anos depois, é tudo o que o governo tem a dizer?
Como “defesa”, os ministros disseram que quem foi às ruas não foi o eleitor de Dilma, foi o eleitor de oposição. Isso escamoteia o desgaste real e perceptível da presidente recém-reeleita; é uma admissão de que a oposição está cada vez mais forte e mais organizada e confirma que o governo, incapaz de fazer alguma autocrítica, continua autista, isolado, talvez incapaz de ouvir a voz rouca das ruas. Pior: foi para o confronto e perdeu.
O governo, via PT, CUT e UNE, pagou para ver e deu no que deu. Os atos de sexta-feira, organizados, foram relevantes, mas os protestos de ontem, espontâneos, mostraram que os irritados com o governo ultrapassam em muito os aliados do PT.
É hora de o governo lamber as feridas e de a oposição avaliar seriamente como entrar no vácuo das manifestações. Espera-se que Dilma passe a ouvir, a conversar, a ceder, mas isso é querer que Dilma deixe de ser Dilma. Espera-se que o governo recomponha uma economia esgarçada e recupere a capacidade de articulação política com o Congresso, mas é preciso combinar com o PMDB.
E da oposição, o que se espera? Aí está o x do problema. As manifestações foram contra o PT, mas não foram a favor da oposição. O PSDB parece não saber o que dizer, o que fazer e para onde ir, está sem rumo e a reboque das ruas.
E isso leva a um diagnóstico bastante grave: a crise é gigantesca, mas sem saída.
(*) Jornalista é colunista da Folha de São Paulo
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