Luiz Caversan (*)
O Brasil tem jeito, a televisão brasileira é boa, o brasileiro quer trabalhar, é possível acabar com a sonegação de impostos.
De quem é essa piada?
Do Chico Anysio.
Só que não é uma piada, mas sim o resumo resumido de uma entrevista que ele deu para mim 20 anos atrás, aos 60 anos, quando tinha, na principal emissora do país, um programa diário com a escolinha do seu professor Raimundo e outro programa semanal, em que desfilava boa parte dos cerca de 200 personagens que criou ao longo da vida.
Além da presença constante na TV, Chico estava sob todos os holofotes por conta de seu romance com a então já ex-ministra da economia de Fernando Collor, Zélia Cardoso de Melo, odiada por meio mundo por ter havido recentemente confiscado a poupança e a conta corrente do país.
Apesar deste digamos deslize no perfil do Chico (eu tinha uma bronca especial com a Zélia porque ela me tratara mal durante um contato como repórter...), fiquei muito entusiasmado quando fui encarregado de fazer uma "Entrevista da 2ª" para a Folha com ele.
Chico era meu ídolo desde criancinha, eu amava seu personagem Quém-Quém, o garçom fanho, e era fã dos incontáveis outros tantos que foram desfilando para nossa alegria do longo dos anos: Seu Popó, Justo Veríssimo, Coalhada, Alberto Roberto, Roberval Taylor, Azambuja, Pantaleão, Tavares, Haroldo, Nazareno...
Minhas primeiras lembranças de Chico remontam à introdução do hoje popular "stand-up" no Brasil. Se não foi ele o pioneiro sem dúvida terá sido um dos primeiros a fazer rir sozinho em pé no palco ou diante da câmara, utilizando-se apenas de sua capacidade verbal e corporal, sem recursos ou figurinos ou tecnologias. No gogó.
Naquela entrevista, publicada na página 1-10 da Folha de 25 de novembro de 1991, Chico, como sempre sem papas na língua, desfiou algumas de suas verdades. Estava feliz com o namoro com Zélia, com os programas da TV, com a eventual participação como comentarista de futebol numa emissora de rádio e com uma exposição de pinturas que estava preparando.
Riu, brincou e destilou seu tradicional rancor em ralação aos novos humoristas que surgiam nas então novatas "TV Pirata" e "Casseta Popular".
Era, apesar e por causa disso tudo, um homem talentoso, cativante e inesquecível.
Eis algumas das frases que tive o privilégio de ouvir:
"Eu não acho e menor graça no Brasil."
"É preciso que se trabalhe mais. Eu trabalho 15 horas e está bom, tem gente aí trabalhando seis e achando muito."
"Mentira! Eu sou o lançador das novas gerações" (respondendo porque era tão implicante com os novos humoristas).
"Não sei se o temperamento dele (o então presidente Fernando Collor de Mello, apeado do poder no ano seguinte) não vai levar a um estouro. Tenho medo disso."
"Eu não entendo nada de economia, entendo de economista!" (fazendo blague com sua então namorada e futura esposa Zélia.)
"Você não pode elitizar (o humor), se fizer isso você diminui seu público"
(*) Jornalista e consultor na área de comunicação corporativa do jornal Folha de São Paulo
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