Marcos Caetano (*) para O Estado de S.Paulo
No último domingo eu comentei o jogo Santos x Bragantino, na Vila Belmiro, para a TV. Embora muitas vezes já tivesse visto Neymar em ação num estádio, foi a primeira vez que eu acompanhei sua atuação com o envolvimento e atenção que a função de comentarista exige. Além disso, nada como comentar uma partida na cabine do estádio, uma vez que nas transmissões feitas em estúdio, as câmeras estão normalmente com foco em quem está com a bola, não permitindo que o pobre analista consiga ver a movimentação de todos. O envolvimento e a proximidade permitiram que eu pudesse testemunhar uma autêntica caçada humana, cuja presa tem juba de leão e atende pelo nome de Neymar.
Quando eu li as estatísticas da partida e constatei que o Bragantino era a equipe mais faltosa do Campeonato Paulista, com os três primeiros nomes da lista de jogadores mais faltosos da competição, esperei pelo pior. E o pior veio. Não que o Braga seja um time tosco, pois não é. Tem bom passe, um dos melhores ataques do campeonato e luta com boas chances para estar entre os oito melhores da tabela. Só que, para o infortúnio do jovem santista, a proposta de jogo dos rivais incluía o cada vez mais manjado recurso das faltinhas para parar as jogadas. E o problema dessa tática, para os talentosos, é que quanto mais bonita é a jogada, maior a vontade de pará-la - e maior a intensidade das faltas. Neymar, muito, mas muito acima do nível dos demais em campo, pagou o pato.
"Neymar é cai-cai". Todo mundo que acompanha futebol já ouviu essa frase. Acho até que, no começo da carreira, ele foi assim. Mas já faz um bom tempo que sua atitude mudou. Hoje, grosso modo, de cada dez vezes que o garoto cai, sete ou oito são por conta de pancadas. As outras duas são para fugir de pancadas. Simulação? Ele ainda não é como Messi, que jamais simula e, muitas vezes, recebe a falta e prefere se reerguer para continuar a jogada. Mas Neymar hoje simula bem pouco. E o mais revoltante é constatar que, por conta da injusta fama de cai-cai, para cada dez faltas que sofre, só seis ou sete são marcadas.
No jogo do domingo, ele levou tapa na cara, cotovelada no queixo e botinadas de absolutamente todos os matizes. O lado cruel de tudo isso é que, quando foi reclamar com um zagueiro que bateu mais duro que seus companheiros do triste sistema de rodízio de faltas, ouviu do algoz: "Deus te abençoe". O que foi isso? Humor negro? Se essas histórias fossem exclusividade da zaga do Bragantino, nem seriam tão trágicas. A tragédia é que sabemos que outros times, do Paulistão e da Libertadores, times grandes, inclusive, usam a mesma tática para tentar impedir Neymar de produzir a coisa que os que pagam ingresso ou são assinantes de pay-per-view mais querem ver: lindas jogadas.
É por isso que eu insisto: enquanto a arbitragem não for verdadeiramente orientada a proteger os craques - e, com eles, o espetáculo -, o futebol jamais atingirá todo o seu potencial de entretenimento e atração de público.
(*) Jornalista e comentarista esportivo
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