Sérgio Malbergier (*)
Osama Bin Laden é um ícone de um mundo que não queremos (e não teremos).
Embora parte da esquerda, como sempre, possa ter se encantado com sua figura quixotesca e sua cruzada antiamericana, o capo do terrorismo islâmico global era um niilista reacionário que lutava não para derrotar o Ocidente, mas os regimes pró-ocidentais nas terras árabes.
Bin Laden queria, ao derrubar espetacularmente as torres do World Trade Center, conquistar os corações e mentes do mundo árabe em sua cruzada para instaurar o califado islâmico.
Ele é abatido por um esquadrão americano no Paquistão justamente quando as ruas árabes finalmente se levantam contra seus ditadores e opressores.
Mas o que motiva os jovens sírios, egípcios e iemenitas a enfrentarem as baionetas dos ditadores árabes não é o fervor islâmico obscurantista de Bin Laden e seguidores, mas uma ânsia por liberdade muito mais próxima aos valores ocidentais que estritamente islâmicos.
Grande parte dos líderes da revolta árabe em curso foi treinada com recursos de um programa de fomento à democracia no mundo árabe, iniciado no governo de George W. Bush em resposta aos ataques de 11 de setembro de 2001.
É muito mais o Facebook do que o Alcorão que captura a atenção e orienta os jovens revolucionários árabes hoje.
Ao final, Bin Laden estava numa mansão longe da fronteira paquistanesa-afegã e das cavernas que ajudaram a formar o mito do santo guerreiro ascético e contemplativo.
Nada mais cínico e contrário à realidade. A Al Qaeda e as centenas de organizações sangrentas que inspirou pelo mundo nos últimos dez anos derramaram muito mais sangue islâmico do que tropas ocidentais. Principalmente na ensandecida guerra civil iraquiana do pós-guerra, na qual a Al Qaeda Mesopotâmia teve papel seminal.
Os americanos saíram jubilantes às ruas após o anúncio da morte do inimigo número 1, contra quem havia uma recompensa de US$ 25 milhões, "dead or alive".
Mas essa festa não é só americana. A luta contra o extremismo islâmico é a luta pela liberdade. Os atentados terroristas do 11 de Setembro trouxeram novos controles e interromperam a marcha para sociedades mais livres e liberdades individuais mais amplas.
Além de garantir a reeleição de Barack Obama, o fim de Bin Laden aponta para o fim de uma era em que milhões de muçulmanos, desencantados com as condições ultrajantes em suas comunidades, viram o futuro no passado obscuro.
As revoltas árabes levaram esse mundo de volta para o futuro. Elas já tinham matado Bin Laden.
(*) Jornalista e escreve para Folha de São Paulo
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