Augusto Nunes (*)
Até a descoberta do milagre da multiplicação do patrimônio, Antonio Palocci era o único ministro que parecia livre do risco de levar um pito de Dilma Rousseff. A aparição do traficante de influência transformou o poderoso chefe da Casa Civil no único que levou um pito do vice Michel Temer, que prefere sussurrar até em discussão de botequim. Antes, o superministro da presidente abúlica chamava a chefe de “Dilma”. Agora, na imagem de Stanislaw Ponte Preta, Palocci deve andar chamando urubu de “meu louro”.
Prisioneiro da mentira inaugural, segue contando uma atrás da outra e jurando inocência. Na semana passada, sem ter virado réu oficialmente, contratou de novo os serviços do advogado José Roberto Batochio. Recorrer ao doutor Batochio já é uma admissão de culpa, informa a lista de fregueses. Mas o camburão fica mais distante, comprovou a sessão do Supremo Tribunal Federal que, em 27 de agosto de 2009, livrou Palocci de qualquer envolvimento no estupro do sigilo bancário de Francenildo Costa.
Para inocentar o culpado, Batochio acusou a vítima. Conseguiu livrar o cliente “por falta de provas”. Não conseguiu condenar o caseiro por falta de tempo. Mas contribuiu para que o ministro Gilmar Mendes, presidente do STF e relator do caso, inventasse outra brasileirice: o crime encomendado sem mandante (veja na seção O País quer Saber os melhores-piores momentos do parecer). “Não há dúvida quanto ao recebimento por Antonio Palocci dos extratos, mas não foi ele quem acessou a conta, e sim, funcionários da Caixa, autorizados por suas competências funcionais a acessar os dados”, diz um trecho do papelório aprovado por 5 votos a 4.
“O suposto interesse de Palocci em ter desacreditado o depoimento do caseiro não basta para que ele seja responsabilizado, se não há provas concretas”, continuou o relator. Feito o esclarecimento, resolveu que o presidente da Caixa, Jorge Mattoso, fora o responsável por tudo: “Ele estava autorizado a acessar os dados, mas não revelá-los a terceiros. Portanto, quanto a ele, há elementos para o recebimento da denúncia”.
“O Supremo não é sujeito à influencia política nem à opinião das ruas, a absolutamente nada, o compromisso dele é com a lei”, festejou o doutor Batochio ao fim do julgamento. “Palocci não tem mais nenhum processo criminal. Não existe nada na Justiça contra ele. Está zerado”. Estava: neste 25 de maio, o palavrório de Gilmar Mendes e Batochio foi implodido pela própria Caixa Econômica Federal. Condenada a pagar uma indenização de R$ 500 mil a Francenildo Costa, a direção da CEF informou, num recurso à Justiça, que foi o então ministro da Fazenda quem encomendou o crime.
Foi ele também, em parceria com o assessor de imprensa Marcelo Netto, quem repassou à revista Época informações que, além de obtidas criminosamente, eram falsas. A confissão dos cúmplices, escondida por cinco anos, confirma que o estuprador de sigilo mentiu o tempo todo. Como vem mentindo agora o traficante de influência, sempre confiante na esperteza do advogado. No resto do mundo, a história se repete como farsa. No Brasil, a impunidade permite que a farsa se repita como farsa.
Desta vez, Batochio terá mais trabalho para garantir o triunfo da injustiça. Em 2009, Palocci estava voltando ao coração do poder. Neste outono, leva pitos até do vice que não levanta a voz sequer em comício. O chefe da Casa Civil hoje é só o caseiro do Planalto. Nada a ver com Francenildo: Antonio Palocci é um caseiro que mente.
(*) Jornalista e Ex-Diretor do Jornal do Brasil, do Jornal Gazeta Mercantil e Revista Forbes. Atualmente na Revista Veja.
Nenhum comentário:
Postar um comentário