terça-feira, 17 de maio de 2011

Serviço público... ou desinformação

Riad Younes (*) para Terra Magazine 

O número de pesquisas novas em medicina é astronômico. Mais de 4500 trabalhos científicos médicos foram publicados somente nos primeiros meses de 2011. Estes estudos têm rigor cientifico, relevância clínica e aplicação no dia a dia das pessoas muito variada. A qualidade do que é publicado nas revistas médicas é muito desigual. Existem alguns estudos executados com cuidado, ética, imparcialidade e transparência exemplares. Infelizmente, a maioria ainda contém falhas no método, a ponto de tornar sua interpretação difícil, e sua aplicação na clínica duvidosa.

Muitos médicos - infelizmente não todos - sabem analisar de forma criteriosa os estudos, distinguem a boa pesquisa daquela inconsistente, e trazem à sua prática médica rotineira o que pode claramente ajudar seus pacientes. Mas como as pessoas leigas, as autoridades políticas, e até os médicos não especialistas têm acesso aos estudos "relevantes"? Como separar o joio do trigo? Como não confundir estudos essenciais de pesquisas que somente servem como "marketing" disfarçado deste ou daquele medicamento, desta ou daquela tecnologia?

Para os médicos, existem reuniões científicas, palestras de especialistas que tentam "digerir" os resultados recentemente publicados em revistas médicas. Para os outros, leigos na arte médica, existe a mídia. E aí começam os problemas. Muitos dos jornalistas que relatam as novidades médicas têm treino e conhecimento para poder selecionar os bons estudos. Mas a maioria absoluta não parece ter preparo suficiente para esta tarefa. Não vou nem mencionar meios de comunicação, e jornalistas, facilmente influenciáveis por notícias importantes, "press release" estrategicamente plantado para chamar a atenção a um remédio ou um instrumento.

Muitos jornalistas se contentam com informações fornecidas por indústrias farmacêuticas ou fábricas de instrumentos e de aparelhos. Muitos ainda entrevistam especialistas, médicos ou não, sugeridos pela própria indústria! Seria, no mínimo mais adequado, procurar outros nomes que atuam na mesma área, para se ter informação e análise mais balanceada. Relatar ao público leigo a informação médica, com clara referência aos benefícios das novidades, mas também suas limitações, efeitos colaterais, erros e riscos embutidos neste ou aquele tratamento.

Um estudo realizado dois anos atrás por um professor de jornalismo da Universidade de Harvard, apontou que mais de 59% de todas as reportagens médicas da mídia leiga nos Estados Unidos têm interpretação errônea dos estudos, e transmitem conclusões impróprias para leitores ou ouvintes. No Brasil, isso não deve ser muito melhor. Como médico, junto com muitos colegas, percebo com tristeza manchetes de jornais e revistas, de noticiários de TV e sites de internet, divulgando notícias que não correspondem totalmente à verdade. Por desinformação e má interpretação, ou por malícia.

Enquanto a notícia embasada consegue ajudar a população a cuidar melhor de sua saúde, informações errôneas levam à desinformação. Prejudicam os leitores, e, pior, desorientam e colocam falsas esperanças em doentes que sofrem de doenças graves e crônicas. Câncer, AIDS, são as mais comuns. Está na hora de filtrar estes relatos. Vários jornalistas sérios têm criado cursos para melhorar a qualidade da informação médica divulgada aos leigos. Tentarei, nesta coluna, ajudar os leitores a separar o útil do inútil neste mar de publicações. Muitos médicos também o fazem. Entre estes, gostaria de destacar o trabalho incansável do Dr. Drauzio Varella. Divulga a ciência para o benefício dos indivíduos e dos pacientes. E destes somente.

(*) Professor Livre Docente da Faculdade de Medicina da USP. Médico do Centro Avançado de Oncologia do Hospital São José e do Núcleo Avançado do Tórax do Hospital Sírio Libanês, São Paulo. Especialista em câncer de pulmão. Foi Diretor Clínico do Hospital Sírio Libanês de março 2007 a março 2011.

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