sábado, 9 de abril de 2011

O horror, o horror

Luiz Caversan (*)

Incompreensível, inexplicável, abominável, execrável, odioso, nefando, aterrorizante, paralisante, inominável, ignominioso.

Nem mesmo recorrendo ao dicionário, nem conseguindo reunir uma dezena de palavras ou mais, tampouco os argumentos todos que se arregimentarem aqui serão suficientes para, remotamente, descrever a indignação, a dor na alma, o pasmo causado pelo massacre do Rio de Janeiro.
Crianças, meus filhos, seus filhos, brasileirinhos, como disse nossa inconformada presidente, ceifados assim, sem mais, na sua inocência e na sua impotência.
Tanta atrocidade em nome de Deus?

Qual deus, perguntou na Folha o colunista Rui Castro?
Será que é o mesmo deus que o homem, desde seus primórdios, usa para justificar sua maldade, uma maldade que, anos, décadas, séculos de iluminismos depois, permanece arraigada firmemente à alma humana?
É o indelével carimbo da maldade no DNA humano.

A maldade da qual o homem não se livra jamais.
A maldade dos que até tempos atrás empalavam seus inimigos.
A maldade dos que ainda hoje apedrejam suas mulheres até a morte.
A maldade dos que pregavam na cruz seus detratores --é só entrar em qualquer igreja católica que lá veremos o tradicional instrumento de tortura.
A maldade dos que traziam das batalhas os escalpos de suas vítimas.
A maldade dos que fechavam a porta e abriam o gás.
A maldade dos que extirpam clitóris em nome de uma moral selvagem.

Sim, é ela, a mesma maldade de quem abre fogo contra crianças.
Exatamente a mesma, a maldade humana em sua mais pura manifestação, límpida, transparente.
Em seu raro e derradeiro momento de lucidez, o personagem Kurtz de "No Coração das Trevas" (romance seminal do inglês Joseph Conrad, que inspirou o filme "Apocalipse Now", de F.F. Coppola) define em uma frase a iniquidade de sua condição, envolto em medo, escuridão e canibais fanáticos, ao mesmo tempo em que com desenha com maestria o contexto de seus mais baixos instintos, que são os mesmos de todos nós.

"O horror, o horror."
Sim, ele está falando do homem, do Homem e de tudo o que ele é capaz.
Loucura, fanatismo, surto, trauma: podem culpar quem e o que quer que seja, muçulmanos, cristãos, pirados e pedófilos, que não adianta, nada explica: a única razão para tirar da vida as 12 crianças de Realengo foi a maldade.
A maldade cuja marca está na alma de todos nós e que de tempos em tempos diz a que veio.

Vai, mas volta...

(*) Jornalista, produtor cultural e consultor na área de comunicação corporativa da Folha de São Paulo

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