O Estado de São Paulo
Praias e festas com gente bonita e alegre bebendo são comuns em anúncios publicitários de cervejas. Essas cenas atraem os adolescentes e estão diretamente associadas ao consumo da bebida alcoólica por jovens entre 11 e 16 anos, que não teriam idade para ingerir esse tipo de produto. É o que mostra um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) que acaba de ser publicado pelo periódico científico Revista de Saúde Pública.
A pesquisa também revelou que os jovens prestam muita atenção aos anúncios. E dizem acreditar que as propagandas retratam “apenas a verdade”. Isso, segundo os pesquisadores, tem relação com o consumo precoce do álcool. “Os jovens já têm até uma marca preferida de cerveja”, diz a psiquiatra e autora do estudo, Roberta Faria.
Vice-presidente da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), instituição que representa AmBev e Schincariol, entre outras indústrias, Rafael Sampaio contesta a pesquisa, mas admite que os fabricantes sabem que a publicidade tem influência sobre o consumo de cerveja por adolescentes. “Sabemos que há um ‘vazamento’ do sinal além do público-alvo do produto”, diz ele.
No estudo, 1.115 estudantes de 11 a 16 anos, dos 7° e 8º anos de três escolas de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, responderam a um questionário com mais de cem variáveis ligadas à ingestão de álcool – sendo o método por variáveis uma forma de investigação científica descrita na literatura médica.
“A escolha da cidade foi baseada em informações do IBGE que indicam São Bernardo com um perfil socioeconômico parecido com o padrão nacional”, explica Roberta.
Já a amostra (alunos dos 7º e 8º anos) foi determinada por dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), de 2004, que indicam o início do consumo de álcool no Brasil, em média, aos 12,5 anos. “Não podemos atribuir o consumo de cerveja aos comerciais, mas a pesquisa aponta que eles estão associados ao ato”, afirma a psicóloga e vice-presidente da Associação Brasileira dos Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead), Ilana Pinsky.
Tabaco e pais
Não só a propaganda está ligada à iniciação alcoólica, segundo o estudo. “Pouco controle dos pais e consumo de cigarro também aparecem diretamente associados”, afirma Ilana, que coordenou o estudo.
O consumo de cerveja foi menor no grupo de jovens que respondeu “dar satisfação aos pais” ao sair sem a companhia de parentes. “O jovem vai imitar o comportamento do adulto, está na fase de experimentação, da curiosidade”, explica a psiquiatra e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria, Ana Cecília Marques.
Mesmo que os pais não bebam, Ana diz que o adolescente pode reproduzir atitudes de outros adultos. “Como nosso modelo social é tolerante com a cerveja, mesmo que o jovem não veja os pais bebendo, pode ser influenciado por outras pessoas”, afirma. Para ela, o discernimento ainda está sendo moldado na adolescência.
Mãe de um adolescente de 13 anos, a microempresária Márcia Alba, de 40 anos, mantém um diálogo aberto sobre o tema. “Conversamos sobre álcool e drogas em casa, faço questão. É preocupante a facilidade com que os jovens têm acesso às bebidas”, diz.
O filho dela, Rafael, ainda não tem autorização para frequentar baladas justamente por causa disso. “Ele pode sofrer pressão dos colegas para consumir bebidas. Quero conscientizá-lo das escolhas e do perigo do álcool”, completa.
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