Roberto Macedo (*)
Ao examinar a outorga do Nobel segundo a cidadania dos premiados, deparei-me com esse placar, que reafirma o atraso do País no plano científico e o não reconhecimento internacional de personalidades brasileiras em outras áreas cobertas pelo prêmio. Em ciências ele é outorgado em Física, Química e Fisiologia ou Medicina, e há também uma láurea para Economia. Além disso, há os prêmios de Literatura e Paz.
Essa contagem pela cidadania envolve dificuldades, pois às vezes se confunde com avaliações que consideram o país de nascimento. Mas, mesmo contando dessa forma, os argentinos ganhariam de goleada.
O que fazer? Em várias áreas o Brasil vem avançando na formação de doutores e de outros pesquisadores. Publicações de seus artigos em revistas científicas no País e no exterior também aumentaram em número. Mas sabe-se também que recursos para o dia a dia das pesquisas continuam escassos e há outras dificuldades, como as burocráticas na importação de insumos indispensáveis ao trabalho em laboratórios.
Como outros, nós, economistas, temos um olhar focado em processos e resultados. Mais que muitos, entretanto, acreditamos que estímulos econômicos favorecem o alcance de resultados, até porque contribuem para acelerar processos. Esses estímulos podem ser em dinheiro ou em outros valores atribuídos a esforços realizados e ao reconhecimento deles.
Nessa linha, pode-se constatar que a premiação em dinheiro para avanços científicos e tecnológicos tem tradição secular e vem se acelerando nos últimos anos. Assim, a edição de 7/8 da revista The Economist destaca que os resultados de prêmios dessa natureza são avaliados como satisfatórios. A reportagem mostra que a sua concessão vem crescendo internacionalmente. O número dos que têm valor de US$ 100 mil ou mais aumentou de cerca de 50 em 1995 para perto de 300 em 2009. A mesma revista menciona estudos que encontraram relações entre as pesquisas premiadas e patentes subsequentes.
A propósito, vale registrar que recentemente o professor José Goldemberg, conhecido cientista brasileiro, recebeu a edição de 2010 do Prêmio Ernesto Illy Trieste de Ciência, no valor de US$ 100 mil, outorgado a eminentes cientistas de países emergentes por significativas contribuições à ciência e a desenvolvimentos nela baseados. Soube da notícia num encontro casual com o próprio premiado, que, aliás, com razão, demonstrava evidente satisfação por ter sido contemplado.
Baseado em considerações como essas e outras resultantes de discussões no âmbito da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o senador Alfredo Cotait (DEM-SP), que recentemente assumiu a cadeira do senador Romeu Tuma (PTB-SP), apresentou no Senado projeto de lei que cria o Prêmio César Lattes, assim proposto: "Ao cidadão brasileiro que, por atividades realizadas individualmente ou em instituições localizadas no Brasil, inclusive empresas, receber o prêmio ou láurea internacionalmente conhecidos como Nobel, o governo federal brasileiro lhe outorgará também o Prêmio César Lattes, de valor em reais equivalente ao recebido em coroas suecas." Com a "guerra cambial" que valorizou essa moeda, hoje o Prêmio Nobel envolve cifra perto de US$ 1,5 milhão.
O mesmo projeto propõe também o Prêmio Santos Dumont, "a ser conferido em cinco categorias, à razão de um em cada caso, a cidadãos brasileiros que trabalhando individualmente ou em instituições localizadas no Brasil, inclusive empresas, criarem inovações capazes de resolver determinados problemas cuja solução seja de interesse nacional e gere benefícios para a população e/ou para as atividades econômicas brasileiras".
Quanto ao mesmo prêmio, o projeto estabelece que "o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) definirá os primeiros cinco problemas para cuja solução será oferecido o prêmio", e que "vigorará o prazo de três anos para que os candidatos apresentem suas propostas de solução e o prêmio seja outorgado. Caso a premiação ocorra ou esse prazo se esgote sem que o prêmio seja conferido, um novo problema com igual prazo será proposto em substituição. As soluções serão avaliadas não apenas pela suas características científicas e tecnológicas, como também pela viabilidade de sua aplicação prática com ênfase na relação entre seus custos e benefícios". O valor do prêmio seria de R$ 1 milhão em cada categoria.
Como exemplo de um problema cuja solução poderia ser estimulada por esse prêmio, a exposição de motivos do projeto menciona uma vacina contra a malária e/ou a criação de novos medicamentos contra essa doença, que minimizem ou eliminem os maus efeitos colaterais dos já existentes.
A íntegra do projeto pode ser encontrada em www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=98439.
A denominação dos prêmios homenageia o físico César Lattes, considerado o mais importante da história do País e o cientista brasileiro que mais perto esteve da premiação do Nobel, de Física. E Santos Dumont, pela sua engenhosidade como pioneiro da aviação.
Espero que o projeto seja aprovado no Congresso e sancionado pela futura presidente Dilma, que por outros engenhos e artes vai receber o prêmio Lula na solenidade de sua posse.
Evidentemente, não cabe esperar que os prêmios propostos sejam capazes de resolver as grandes carências brasileiras em avanços científicos e tecnológicos. Mas, inegavelmente, poderão contribuir para as pôr em discussão e para agilizar processos e resultados. E, ainda, para estimular pessoas e equipes a se empenharem com maior vigor nesse outro jogo que disputamos com outros povos, o de "bolar" significativos avanços dessa natureza em benefício da humanidade, e ter seu mérito reconhecido sobretudo no seu próprio país.
(*) Economista (UFMG,USP e Harvard), Professor e Associado à FAAP é Vice-Presidente da ACSP
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