Opinião do Estadão
Governadores eleitos ou reeleitos pela oposição estão organizando uma reunião a ser realizada logo depois do feriado do dia 15 para reclamar a compensação pelas alegadas perdas de receita em que teriam incorrido as Fazendas estaduais com a desoneração das exportações de produtos primários e semielaborados, decorrente da Lei Kandir. Na reunião, eles discutirão também formas de pressão sobre o governo federal para que seja feito o pagamento que consideram devido. Depois, buscarão a adesão dos governadores ligados ao governo federal - e é provável que a consigam, pois esse é um tema que interessa a todos eles, independentemente da filiação partidária.
É, também, um tema irritantemente recorrente - seu debate se repete a cada ano, pelo menos desde 2006 -, que mostra a voracidade fiscal dos governantes, as aberrações do sistema tributário e a incapacidade dos políticos em geral de encontrar soluções até mesmo paliativas para as distorções mais notórias.
As compensações referentes à Lei Kandir interessam muito mais aos governadores do que o debate sobre a recriação da CPMF, o imposto sobre o cheque. De acordo com cálculos feitos pelos atuais secretários estaduais da Fazenda, as desonerações sobre as exportações implicaram "perdas" aos cofres estaduais de R$ 19,5 bilhões desde 2005. "Os governos estaduais têm de ser ressarcidos", disse ao Estado o governador eleito de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). Perillo já discutiu o assunto com o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, e ambos concluíram que o assunto é prioritário.
Aprovada em 1996, a Lei Kandir isentou do ICMS, o principal tributo estadual, todas as exportações (até então, só as exportações de produtos manufaturados eram isentas desse tributo). Previa-se que, nos primeiros anos, a medida poderia acarretar perdas aos Tesouros estaduais. Por isso, foi instituído um sistema de compensação para os casos em que essas perdas fossem constatadas, que deveria vigorar até 2002. Nesse período, o estímulo à atividade econômica decorrente do aumento das exportações já teria compensado as eventuais quebras temporárias de receita e propiciado até mesmo o aumento da arrecadação.
Quando o prazo para a compensação das perdas estava para se esgotar, os governadores pressionaram o governo federal e o Congresso, e conseguiram estender sua vigência até 2006. Desde aquele ano o pagamento dessa compensação tem sido motivo de disputa entre o governo federal, que considera o caso encerrado, pelo menos de acordo com a legislação em vigor, e os Estados, que passaram a considerar o pagamento como uma espécie de "direito adquirido".
O governo federal baseia seu argumento na Emenda Constitucional n.º 42, segundo a qual a União entregará aos Estados e ao Distrito Federal o montante referente à desoneração do ICMS sobre produtos primários e semielaborados exportados, mas condiciona esse pagamento à aprovação de uma lei complementar, visto que a anterior, na sua interpretação, deixou de vigorar em 2006. Os governadores, invocando essa mesma emenda, alegam que têm direito ao pagamento compensatório.
Por isso, nas propostas orçamentárias dos últimos anos, o governo federal não tem incluído a compensação pela desoneração decorrente da Lei Kandir. A resposta dos governadores a esse comportamento do governo federal tem sido a ameaça de não repassar para os exportadores os créditos de ICMS devidos. Fizeram isso no ano passado, na discussão do Orçamento de 2010, e conseguiram do governo federal a destinação de R$ 3,9 bilhões como compensação.
A ameaça está sendo repetida. Em 2011, nas contas dos Estados, o valor deve ser de R$ 7,2 bilhões. Ainda não houve acordo com o governo federal, daí a pressão que começa a ser feita pelos governadores que tomarão posse em janeiro.
Mais uma vez, os exportadores - que reclamam R$ 20 bilhões em créditos não repassados pelos Estados - estão sendo usados nessa disputa que nenhum dos lados parece interessado em resolver de maneira definitiva.
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