Luiz Caversan (*)
Em 20 anos acompanhando campanhas eleitorais para presidente -- 21 para ser mais exato, porque minha campanha de estreia foi a primeira pós-democratização, em 1989--, nunca fiquei tão chateado como ao longo da que agora se encerra.
Naquela eleição, havia Collor, e dele sabíamos que se podia esperar tudo o que acabou fazendo, na campanha e na Presidência.
Mas, agora, fazia tempo que não via tanta grosseria, tanta maledicência, tanta acusação sem sentido e tanto desrespeito.
Sobretudo desrespeito pela inteligência das pessoas, grande parte delas atacada por um forte surto justamente de falta de inteligência.
De modo que já vai tarde esse embate eleitoral em que as ideias foram deixadas de lado para se voltar ao tempo das trevas, em que crenças, moralismos e medos obscurantistas falaram mais alto do que a discussão verdadeira do que é melhor para o país.
Foi péssima esta campanha, o tom beligerante contaminou o dia a dia de tal forma que nos últimos tempos eu simplesmente me recusei a participar de qualquer conversa que envolvesse preferência por este ou aquele candidato.
Exemplo: sou um afortunado, tenho mais de 900 amigos na rede virtual de relacionamento Facebook. Pois nas últimas duas semanas dei um chega pra lá em pelo menos uns 20 desses parceiros virtuais. Avisei antes que iria dar um "hide" (esconder, no linguajar da rede social) os que insistissem nas grosserias e ofensas a um ou outro candidato --aqui a democracia imperou, pois houve deselegância e falta de classe nos dois lados, equilibradamente.
Mas o aviso não adiantou, as barbaridades continuaram e muita gente foi pro limbo virtual; logo mais as resgato, porque eleição passa, amigos são (ou devem ser) para sempre...
O problema é que esse tipo de clima ruim, muito ruim não se restringiu ao mundo da internet, antes fosse. Há relatos de brigas, desentendimentos e gente de relacionamento antigo que parou de se falar. Eu vi isso de corpo presente em pelo menos duas ocasiões (uma festa e uma reunião social que deveria ser amena) em que o tempo fechou, e pessoas cultas, educadas e instruídas quase foram às vias de fato simplesmente porque um gosta de vermelho e outro de azul.
Não é simples assim? Não? Ah, sim, claro, é muito mais que vermelho e azul. Mas a preferência política das pessoas, do meu ponto de vista, deve ser respeitada de maneira tranquila e equilibrada assim como respeita-se que uns gostem de vermelho, outros de azul, de roxo ou de branco. Ponto final.
Diverge-se? Dialoga-se, argumenta-se e cada um defende seu ponto de vista ci-vi-li-za-da-men-te, ok?
O que quero dizer é que a desinteligência tem imperado, seja nas peças propagandísticas que nos tentam nos convencer a acreditar em cretinices, seja na vida real, na qual o bom senso cedeu o lugar à prepotência e o diálogo sucumbiu ao palavrório dos que se arvoram de donos da verdade.
Espero sinceramente que a derrota de uns e a vitória de outros não gerem ressentimentos tais que levem este estado de espírito deletério para além destas eleições, que poderiam ter sido uma grande festa democrática, num país que segue satisfatoriamente seu caminho, mas não foram.
(*) Jornalista, produtor cultural
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