quarta-feira, 11 de julho de 2012

Mas o "se" não joga, não é?



Bellini Tavares de Lima Neto (*)


Como dizem os torcedores e entendidos do futebol, o “se” não joga. 
É a mais pura verdade. Mas, e se jogasse? Bem, aí por certo teríamos uma porção de situações completamente diferentes. Se a bola não tivesse batido na trave, se o fulano não tivesse perdido aquele gol bem na cara do goleiro, se aquele outro não tivesse metido a mão na bola e por aí afora. Os resultados seriam diferentes, as gozações teriam sido outras. Mas, o “se” não joga, não é? Então, paciência.


Ao ensejo do 80º aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932 leu-se nos jornais e revistas menção a dois episódios que parecem ter ganhado grande número de adeptos e
entre os estudiosos e historiadores.


Um deles foi o fato de que praticamente todas as reivindicações do Estado de São Paulo concernentes ao interventor (figura que substituiu o governador do Estado durante o período getulista) e ao comandante da Força Pública foram aceitas pela ditadura. Assim, as razões iniciais para que a guerra fosse deflagrada, a rigor não existiam mais. 


O outro se refere à decisão do então Coronel Euclydes de Figueiredo, comandanta das tropas paulistas em direção ao Rio de Janeiro, de não prosseguir na escalada e decidir esperar pela chegada de prometidos contingentes mineiros e gaúchos que, no fim, nunca chegaram. 
Dizem os historiadores que se as tropas paulistas tivessem avançado diretamente ao Rio de Janeiro, muito provavelmente teriam contado com o apoio dos cariocas e demais estados da União. 


Com isso, Getulio Vargas também muito provavelmente, teria sido deposto. A decisão do então coronel Figueiredo permitiu que as forças federais se preparassem e cercassem os paulistas infringindo, ao final de 84 dias, a derrota em armas, 


Se o “se” jogasse, se Figueiredo tivesse prosseguido com as tropas paulistas tivessem prosseguido e Getulio tivesse sido deposto, o que teria ocorrido com o Brasil? 
O cineasta Quentin Tarantino produziu há pouco tempo um filme denominado “Bastardos Inglórios” em que se cria uma vertente na história da II Guerra Mundial. Hitler e todo o alto escalão nazista são mortos em uma emboscada armada dentro de um cinema. Com isso, simplesmente a guerra não prosseguiu. O mundo, seguramente, foi outro depois disso. 



Com a possível queda de Getulio logo em 1932 é bastante provável que novas eleições ocorreriam e o país retornasse à normalidade democrática. 
Não haveria, então, o golpe de 1937 ao qual o caudilho deu o nome de Estado Novo. 
Não teria havido uma ditadura de 15 anos que, como todas as ditaduras, independente da coloração ideológica (se é que ela existe) só causa atraso no processo de desenvolvimento social de qualquer país. 
Não teríamos vivido todo o longo período demagógico que se pautou por um populismo viciante e deformador do caráter cívico de toda uma população. 
Ao contrário, o país teria tido a chance de se desenvolver cultural, social e politicamente, de forma gradativa e não aos saltos como a história está farta de demonstrar que não dá certo. 

Sem a interrupção perniciosa desse processo causada pelos 15 anos de ditadura, não se chegaria aos anos 60 ainda engatinhando na forma de reivindicar. É bastante razoável imaginar que não teria havido o contágio pela onda comunista que marcou o começo dos anos 60 e que, de alguma forma, levou ao golpe militar de 1964. 
E o golpe só fez prosseguir no encalhamento do débil processo de desenvolvimento social, cultural e político que mal havia começado ao término da ditadura anterior. O país voltou a mergulhar no poço escuro da ditadura onde se pratica a velha máxima romana do pão e circo e se deixa a sociedade embotada em falsas euforias de desenvolvimento sem qualquer sustentação concreta. 


Exemplos disso são a nenhuma estrutura de transportes que ainda está por aqui. 
Esse atraso também é atestado pela verdadeira falência da educação que, lá pelos idos dos anos 50 e até metade dos 60 ganhava impulso e qualidade. 
A sociedade, mantida em estado de letargia, foi sendo tocada como gado por longos 21 anos. 
Quis a ironia da história que o último dos generais que se sucederam fosse precisamente um outro Figueiredo, irmão do outro anteriormente citado e que pediu, desnecessariamente, que fosse esquecido. Não foi preciso pedir. Esse era seu destino natural. 


O que seria do Brasil se não tivesse sido mantido nesse estado de entorpecimento durante mais de meio século? 
Onde se poderia estar se, ao invés de ditadores, tivéssemos vivido o processo democrático normal, sem a intervenção dos que se reservam o direito de pensar no lugar de toda uma sociedade? 


Que espécie de gente os brasileiros teriam levado ao poder se não tivessem sido privados de sua capacidade de discernimento por tanto tempo? 
Qual seria a situação de uma terra tão rica e pródiga se não tivesse sido mantida na letargia em que ainda vive, feliz com as sobras do banquete e partidária da inércia social, cultural e política? 
Será que teríamos naufragado nesse lamaçal de corrupção que consome esta terra como ratos famintos?
Será que teríamos sido contagiados por esse vírus do populismo que mantém tudo sempre no mesmo estágio e insiste em incensar os demagogos como se fossem figuras canonizáveis? 


Pode sere que se o primeiro Figueiredo tivesse avançado, tudo isso fosse muito diferente. E pode ser que não. 
O tempo já passou e com ele uma quantidade preciosa de oportunidades que o mundo viveu. 


Pois é. O “se” não joga, não é. 


(*) Advogado e avô morador em São Bernardo do Campo (SP)

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