Jornal da Tarde/São Paulo
Não sei se o problema é comigo ou com a política: mas eu fico constrangido quando tenho de me declarar candidato a alguém. Fico tão embaraçado que a coisa toda soa como se eu dissesse: “Meu nome é fulano de tal e eu sou o candidato que vai defender o extermínio dos animais de estimação – principalmente aqueles fofos que costumam fazer companhia às criancinhas órfãs.
Mas antes de narrar uma passagem constrangedora da minha carreira, eu preciso entrar num assunto chato e burocrático: o CNPJ.
Numa campanha, o número do Registro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) é um item indispensável. Sem ele, você não pode abrir sua conta eleitoral – que nada mais é do que uma conta bancária exclusiva para movimentações financeiras de campanha.
Do ponto de vista legal, toda e qualquer doação deve ser registrada e depositada nesta conta – e cada apoiador (pessoa física) só pode doar até 10% do próprio rendimento bruto anual.
Não é difícil encontrar espertalhões aconselhando candidatos de primeira viagem a usarem “laranjas” para burlar essa rígida regra da Justiça Eleitoral.
De acordo com a história que eu ouvi, a coisa funciona assim:
se você tem uma doação de R$ 10 mil que não pode ser registrada, você arruma dez CPFs – e põe R$ 1 mil em cada um.
De posse do meu CNPJ, fui à agência de um banco estatal para abrir a conta.
Lá, o gerente me alertou que não seria possível porque estaria faltando um documento: a ata partidária.
Liguei para um representante do partido e soube que outros colegas de legenda estavam passando pelo mesmo perrengue. A promessa de solução não pareceu muito convicta. Desanimado, ouvi do atendente que, num banco privado, eles não estavam exigindo a tal da ata. Sem paciência para mais burocracia, me dirigi ao outro banco.
Ali, odiei, verdadeiramente, ser candidato: uma gerente gata me atendeu. Embora tenha sido profissional e educada, ela não se deu ao trabalho de disfarçar o desprezo de estar diante de um reles candidato.
“Você quer ser vereador?”, perguntou, sem tirar o sorrisinho irônico do rosto.
Tudo o que eu queria era dar uma piscadinha cúmplice e esclarecer o mal-entendido.
Nada disso.
Engoli o orgulho xavequeiro e me apequenei na incômoda condição de candidato invisível à Câmara Municipal.
E foi assim: ela abriu a minha conta; me deu seu cartão e riu por dentro (tenho certeza).
Ser político é uma vergonha.
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