Opinião do Estadão
A China virou um pesadelo para a indústria brasileira, deslocada pela concorrência chinesa tanto no mercado externo quanto no interno. Mas não adianta só esbravejar e reclamar das condições da concorrência nem recorrer somente a medidas defensivas. O mercado chinês é a maior fonte de receita comercial do Brasil - US$ 30,8 bilhões no ano passado, 15,2% do valor total. Além disso, a economia chinesa foi no ano passado a segunda maior fornecedora de produtos para o mercado brasileiro - US$ 25,6 bilhões, ou 14,1% de toda despesa de importação. A China já tomou da Alemanha o posto de maior potência exportadora do mundo, tem uma presença dominante em todos os mercados e sua importância deve ser levada em conta em qualquer planejamento de comércio exterior. No Brasil, isso é tarefa não só para o setor privado, mas também - e especialmente - para o governo federal. A sondagem especial divulgada na quinta-feira pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) apenas mostra como as empresas brasileiras têm sido afetadas por esse comércio e como têm procurado aumentar seu poder de competição. É só uma parte da história, mas é uma contribuição importante para a formulação de políticas.
Segundo esse levantamento, 52% das empresas exportadoras brasileiras concorrem com as chinesas no mercado externo. Desse total, 67% perderam clientes. A concorrência se dá em todos os mercados e também na América Latina as indústrias nacionais têm perdido espaço, como já indicaram outros estudos. Até no Mercosul as companhias brasileiras têm sido deslocadas.
Também no mercado interno a produção originária da China tem ocupado espaço cada vez maior. A concorrência chinesa afeta 28% das 1.529 empresas consultadas na pesquisa e 45% delas perderam para ela participação no fornecimento aos clientes nacionais. Os setores mais afetados têm sido os de material eletrônico e de comunicações, têxteis, equipamentos hospitalares e de precisão, calçados, máquinas e equipamentos e "indústrias diversas".
Não há na sondagem da CNI uma referência direta aos fatores da perda de competitividade. O gerente executivo da Unidade de Política Econômica da entidade, Flávio Castelo Branco, mencionou numa entrevista algumas vantagens dos produtores chineses: custo salarial menor, juros baixos, infraestrutura mais eficiente, menos entraves burocráticos e, naturalmente, câmbio desvalorizado. Segundo ele, este último é o fator mais importante.
Os empresários brasileiros também se queixam frequentemente do câmbio. O real está valorizado não só em relação ao yuan - um desequilíbrio observado há muito tempo -, mas também diante do dólar. A relação real/dólar agravou-se a partir da crise financeira internacional, com a forte depreciação da moeda americana. Como o governo chinês atrelou o yuan ao dólar, a desvantagem cambial brasileira aumentou nesse período.
Mas o empresariado não pode cuidar do câmbio nem tem como reduzir o peso dos impostos - outro objeto de queixas frequentes. Dentro de seu campo de ação, 50% das indústrias já escolheram estratégias para fortalecer seu poder de competição, investindo principalmente em fatores de diferenciação, como qualidade e design. Mas há também políticas de redução de custos e de ganhos de eficiência.
O governo tem procurado atender principalmente a uma parte das queixas do empresariado, impondo barreiras a produtos chineses para conter o dumping. O governo também pode combater a triangulação (quando o produto é reexportado de um terceiro país) e já se fala em adoção de selos de qualidade.
Mas providências defensivas têm efeito limitado, podem ser contestadas na Organização Mundial do Comércio e não tornam os produtos brasileiros mais competitivos no mercado externo. Sem renunciar às providências defensivas admitidas pelas normas internacionais, o governo deveria empenhar-se muito mais em outras linhas de ação, como a racionalização dos tributos e o alívio dos encargos trabalhistas. A redução de outros custos, como os de logística, dependerá de investimentos em infraestrutura. Isso consumirá mais tempo e é preciso começar logo.
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