Opinião do Estadão
Realizada pela Polícia Federal com apoio da Secretaria da Segurança Pública e do Ministério Público, depois de mais de um ano de investigações, interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, filmagens e coleta de documentos, a Operação Guilhotina prendeu na manhã da última sexta-feira 45 integrantes das Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro envolvidos em corrupção, participação em milícias, desvio de armas e venda de proteção a bicheiros, narcotraficantes e contrabandistas. Eles também são acusados de terem saqueado bens de bandidos e moradores durante a ocupação do Complexo do Alemão, em novembro.
A descoberta de mais um foco de corrupção nos órgãos policiais fluminenses mostra que não será fácil restabelecer o princípio da autoridade e o império da lei nas áreas que antes eram dominadas pelo narcotráfico. Para os especialistas em segurança pública, o êxito da política de instalação de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) dependia de uma prévia e ampla faxina nas Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro, para evitar que a banda podre contaminasse e desmoralizasse aquela política antes mesmo de sua consolidação.
As escutas telefônicas e as filmagens da Polícia Federal revelaram que os policiais civis e militares presos pela Operação Guilhotina recebiam propina dos traficantes das Favelas do Vidigal e São Carlos, em troca de informações sobre as novas operações e sobre a instalação de UPPs em seus redutos. O esquema protegia o bandido Nem, chefe do tráfico nas Favelas da Rocinha e do Vidigal e um dos bandidos mais procurados do Estado. Cada quadrilha pagava R$ 50 mil por mês a cada policial.
Entre os presos está o delegado Carlos Antonio Oliveira, que até o ano passado foi o principal assistente do chefe da Polícia Civil, Allan Turnowski. E este, por sua vez, é homem de confiança do secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, que classificou como "traidores" os policiais civis e militares detidos pela Polícia Federal e afirmou que a operação de limpeza dos órgãos policiais fluminenses é "dolorosa, mas necessária".
Além de ser suspeito de vender informações sobre operações policiais para o narcotráfico, Oliveira - que teve a prisão preventiva decretada - é acusado de extorsão contra empresários, peculato e formação de quadrilha. A Polícia Federal o acusa, também, de revender para o crime organizado armas, munição e drogas apreendidas em operações policiais realizadas nos Morros da Mineira e São Carlos. Beltrame manteve Turnowski no cargo, mas não se opôs à sua convocação para prestar esclarecimentos.
A corrosão moral e funcional de seus escalões superiores é um dos problemas mais graves que a Polícia Civil do Rio de Janeiro vem enfrentando há muito tempo. Em 2006, por exemplo, outra operação da Polícia Federal apurou que idênticos problemas de corrupção, lavagem de dinheiro, desvio de armas, venda de proteção, extorsão e vazamento de informações para criminosos também ocorreram durante a gestão do delegado Álvaro Lins, que chefiou o órgão durante os governos de Anthony e Rosinha Garotinho. Eleito deputado estadual em 2006, Lins teve o mandato cassado por quebra de decoro parlamentar em 2008 - ano em que também foi preso em flagrante pela Polícia Federal, sob a acusação de continuar recebendo propina do crime organizado. Em 2009, foi demitido "a bem do serviço público" do cargo de delegado e ficou recolhido numa penitenciária de segurança máxima até obter liberdade provisória no Superior Tribunal de Justiça.
Ao ser informado da Operação Guilhotina, que atingiu a imagem da Polícia Civil do Rio de Janeiro justamente quando ela vinha sendo recuperada pela ofensiva contra o narcotráfico nos morros e favelas cariocas, o secretário Beltrame afirmou que uma polícia eficiente e respeitada tem de ser, antes de tudo, uma polícia honesta. Sua reação foi realista e desprovida de corporativismo. Sem o afastamento de sua banda podre os órgãos policiais fluminenses teriam dificuldade para dar continuidade a uma política de segurança pública que, finalmente, parece estar dando certo.
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