Luiza Nagib Eluf (*)
Recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro proferiu decisão polêmica sobre violência doméstica, ao julgar o caso Luana Piovani e Dado Dolabella. Todos sabem que o casal teve um relacionamento amoroso conturbado, que terminou em agressão contra a mulher. Inconformada com o tratamento violento que recebeu, Luana ingressou na Vara de Violência Doméstica do Rio de Janeiro pedindo proteção e punição ao agressor, com base na Lei Maria da Penha, a Lei mais conhecida do Brasil. Surpreendentemente, em sede de recurso, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio considerou que Luana não faria jus aos benefícios da Lei 11.340, de 07/08/2006, por ser famosa, autossuficiente e não vulnerável. Com todo o respeito, está claro que essa conclusão fere dispositivos legais constitucionais (que proíbem todas as formas de discriminação, inclusive aquelas praticadas contra mulheres ricas, bonitas e famosas) bem como infraconstitucionais (a própria Lei Maria da Penha).
É de conhecimento geral que a violência doméstica não se restringe a uma classe social nem às características pessoais de determinadas vítimas. Toda e qualquer mulher está sujeita à agressão patriarcal, tendo em vista que o sistema de dominação feminina ainda não foi banido. A classe social pode influir em outro tipo de criminalidade, principalmente no que se refere aos crimes patrimoniais, mas as Delegacias da Mulher estão sempre lotadas de vítimas pobres e ricas, solteiras e casadas, separadas, amigadas ou namoradas, famosas ou anônimas. A Lei Maria da Penha deixa claro, no artigo 4º, que “na interpretação dessa Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares de violência doméstica e social”. Ora, ao mencionar os fins sociais, a Lei não se refere a fama ou dinheiro. Ela se refere à disparidade de forças entre homens e mulheres em um país que é o sétimo no ranking mundial de violência de gênero. E deixa claro que essa violência precisa parar!
A Lei Maria da Penha não se destina apenas à mulher hipossuficiente, à mulher pobre e desamparada, à mulher carente ou doente, à mulher sem eira nem beira, que infelizmente as há. Ela deixa claríssimo que todas as mulheres são iguais perante a Lei, definindo que configura violência doméstica e familiar contra a mulher “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial” (art.5º).
Quando a lei não restringe, não cabe ao aplicador restringi-la. Não é demais lembrar que, no mesmo querido Rio de Janeiro, Elisa Samúdio teve negado um pedido de proteção contra o goleiro Bruno, que posteriormente a matou da forma mais cruel e abominável que este país já viu. A Justiça entendeu que ela não fazia jus à proteção por não ter relação familiar com o agressor. Como não, se tivera um filho com ele? Os fatos que se seguiram mostraram o quanto aquela mulher precisava da Justiça que lhe faltou. Assim, esperamos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) venha a reformar o mencionado entendimento discriminatório, que pode perpetuar a violência doméstica.
(*) Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, desde 1983, escritora, professora universitária.
Recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro proferiu decisão polêmica sobre violência doméstica, ao julgar o caso Luana Piovani e Dado Dolabella. Todos sabem que o casal teve um relacionamento amoroso conturbado, que terminou em agressão contra a mulher. Inconformada com o tratamento violento que recebeu, Luana ingressou na Vara de Violência Doméstica do Rio de Janeiro pedindo proteção e punição ao agressor, com base na Lei Maria da Penha, a Lei mais conhecida do Brasil. Surpreendentemente, em sede de recurso, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio considerou que Luana não faria jus aos benefícios da Lei 11.340, de 07/08/2006, por ser famosa, autossuficiente e não vulnerável. Com todo o respeito, está claro que essa conclusão fere dispositivos legais constitucionais (que proíbem todas as formas de discriminação, inclusive aquelas praticadas contra mulheres ricas, bonitas e famosas) bem como infraconstitucionais (a própria Lei Maria da Penha).
É de conhecimento geral que a violência doméstica não se restringe a uma classe social nem às características pessoais de determinadas vítimas. Toda e qualquer mulher está sujeita à agressão patriarcal, tendo em vista que o sistema de dominação feminina ainda não foi banido. A classe social pode influir em outro tipo de criminalidade, principalmente no que se refere aos crimes patrimoniais, mas as Delegacias da Mulher estão sempre lotadas de vítimas pobres e ricas, solteiras e casadas, separadas, amigadas ou namoradas, famosas ou anônimas. A Lei Maria da Penha deixa claro, no artigo 4º, que “na interpretação dessa Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares de violência doméstica e social”. Ora, ao mencionar os fins sociais, a Lei não se refere a fama ou dinheiro. Ela se refere à disparidade de forças entre homens e mulheres em um país que é o sétimo no ranking mundial de violência de gênero. E deixa claro que essa violência precisa parar!
A Lei Maria da Penha não se destina apenas à mulher hipossuficiente, à mulher pobre e desamparada, à mulher carente ou doente, à mulher sem eira nem beira, que infelizmente as há. Ela deixa claríssimo que todas as mulheres são iguais perante a Lei, definindo que configura violência doméstica e familiar contra a mulher “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial” (art.5º).
Quando a lei não restringe, não cabe ao aplicador restringi-la. Não é demais lembrar que, no mesmo querido Rio de Janeiro, Elisa Samúdio teve negado um pedido de proteção contra o goleiro Bruno, que posteriormente a matou da forma mais cruel e abominável que este país já viu. A Justiça entendeu que ela não fazia jus à proteção por não ter relação familiar com o agressor. Como não, se tivera um filho com ele? Os fatos que se seguiram mostraram o quanto aquela mulher precisava da Justiça que lhe faltou. Assim, esperamos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) venha a reformar o mencionado entendimento discriminatório, que pode perpetuar a violência doméstica.
(*) Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, desde 1983, escritora, professora universitária.
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