sábado, 25 de fevereiro de 2012

Lixo e sujeira. Santarém fede

Helvecio Santos (*)
Extraido do Blog do Jeso Carneiro  (www.jesocarneiro.com.br)

Inicialmente, para o que quero expor, devo dizer que distingo o lixo da sujeira. Lixo é o descartável imediato que colocamos em determinados locais para coleta pelo serviço público responsável ou empresa terceirizada.

Sujeira é o lixo acumulado, que já faz parte da paisagem, com o qual já se estabeleceu uma intimidade, razão porque o seu mal cheiro não nos incomoda mais. É o que convivemos, por exemplo, em frente à cidade, no que antes foi uma bela praia. Dito isto, vamos aos fatos!

Quando morava em Santarém, idos de 70, comprava verduras e legumes no Mercado Modelo com uma nissei chamada Margareth Shiba (não sei se é assim que se escreve). Eram tempos de dureza, mas, independente da grana, ela sempre me vendia os melhores exemplares, e não raras vezes, com seu inseparável sorriso e o sotaque oriental, dizia: “Leva! Depois paga”.

Nos últimos anos, lecionando no Álvaro Adolfo, trabalhando em um banco e jogando no meu LEÃO, a grana “bamburrou” (uso este termo como homenagem ao Sr. Elval Lins Rabello, por seu “20 Anos nos garimpos do Tapajós”) e ela não mais precisou arriscar seu patrimônio comigo. Neste novo cenário eu deixava a sacola, dizia o que queria e depois voltava.

Pagava e, na despedida, o sorriso sempre estava presente. Hoje, todas as vezes que volto a Santarém, lá vou eu cumprimentar, abraçar, ver a sua venda e ganhar o meu agradável sorriso.

Nas últimas visitas, cada vez mais, uma coisa me incomoda. Ela trabalha em um box a uns dez metros da porta que dá para a Tapajós e, mesmo o trajeto sendo curto, o mal cheiro e o calor são quase insuportáveis. Mas como tudo pode piorar, na parte central do Mercado há um pátio com mesas onde boxs servem refeições e impressiona como as pessoas podem comer ali.

Permanentemente, beirando o quadrilátero do pátio, corre um esgoto a céu aberto. Acho que a Margareth e todos os freqüentadores, e aqui me incluo, merecemos coisa melhor.

Mas, infelizmente, isso não é só privilégio do Mercado Modelo. Para não fugir do perfil, no Mercadão 2000 a sujeira também está por todo lado. Da última vez que lá estive, fins de dezembro passado, um navio estava no porto e por lá transitavam alguns turistas. A cara de espanto e nojo que faziam à vista de tanta sujeira, me deixou envergonhado. Os “flashes” variaram, mas todos tiraram foto dos filhotes que estavam no chão dentro de um balaio e do monte de lixo no canto da feira dos produtores, do qual escorria um fétido chorume.

No dia seguinte, por volta de 11 horas da manhã, uma senhora comia em uma barraquinha assistida a uns 3 metros por um desafiador urubu e, entre o carniceiro e o humano, um esgoto escorria preguiçosamente rumo ao maltratado Tapajós.

Aliás, o Mercadão é um festival de mau atendimento em todos os sentidos. Exemplos? A mão que o vendedor leva ao nariz, é a mesma mão que, sem luva, afunda na farinha para mostrar que ela não é “farinha cuí”. Na seção de peixe, você não pode ir com uma roupa limpa, pois fatalmente irá voltar salpicado de sangue. E olhem que a solução é simplérrima! Basta a administração colocar uma pedra mármore no fundo dos boxs onde os peixes serão “cuidados” e, na frente, instalar um vidro de mais ou menos um metro de altura, atrás do qual os peixes ficarão expostos. Simples, não?

A rua do Comércio, como vários outros logradouros, não só pelo acúmulo de lixo como pelo esgoto que corre a céu aberto, fede. Aliás, todo o centro fede!

Não queiram parar na esquina da rua do Comércio com a 15 de Agosto. É um dos piores lugares, se é que existe pior e melhor lugar. Já na 15 de Novembro com Siqueira Campos, o esgoto é tão largo que uma loja de roupas fez por sobre o “riacho” uma pontezinha de cimento para os fregueses poderem ter melhor acesso.

Pode-se dizer que esgoto a céu aberto é o que não falta em nossa cidade. Também pudera, a cidade não tem um metro de esgoto tratado. O motivo? Bom! Primeiro, a população não cobra. Como disse anteriormente, já faz parte da paisagem, já se estabeleceu uma intimidade. Segundo, eleitor não é tatu! Obra embaixo da terra não dá visibilidade ao governante e, portanto, voto.

Mas, como tudo que está ruim pode piorar, ao cair da tarde o cais é loteado por carrocinhas de “engordiet”. Aí, além do cheiro horrível das muitas línguas de água podre que correm rumo ao Tapajós, vem a fumaça e o cheiro acre dos “petiscos”. E, ao final de muitas vendas, toda sobra de “óleo trinta“ queimado é jogada ali mesmo, a qual vai se juntar aos restos de comida, guardanapos e copos ou garrafas jogadas pelos comensais.

Mas, o que mais preocupa, é o manuseio de botijões de gás e o aglomerado de pessoas. Penso que a Vigilância Sanitária e o Corpo de Bombeiros deveriam tomar providências urgentes, sob risco de um dia a expressão, “subir na vida”, significar algo diferente do que ganhar dinheiro. É humor negro, sim, mas é uma forma de chamar atenção. Afinal, uma explosão de botijão de gás traz sempre sérios danos.

Também uma das piores pragas em todas as cidades do Brasil é a tal da garrafa “pet”. Muitas já equacionaram o problema com a coleta delas. Nesse “quesito” me parece também que não há uma preocupação em Santarém.

Na pracinha da Adriano Pimentel, um dos nossos cartões postais, chega a ser risível a quantidade de “pets” embaixo dos bancos coloridos (ou seriam obras de arte?) que ficam ao lado dos brinquedos disponíveis para a criançada. Um desavisado pensaria que faz parte da decoração. Também é chocante a quantidade de “pets” na faixa de areia entre o Mascotinho e o terminal Fluvial. Numa fotografia à distância, um desavisado pensaria serem garças. Romântico, não?

Para as “pets”, creio que a solução seria um melhor aproveitamento de verba já alocada e aqui dou minha humilde sugestão. Basta que nossa prefeita use a verba do patrocínio dos nossos dois clubes de futebol que participam do Parazãozinho para nos livrarmos dessa praga. Não seria somente “dar” o dinheiro como é feito hoje.

A verba seria utilizada da seguinte forma: uma campanha nos meios de comunicação, postos de coleta, e “x” garrafas seriam trocadas por um ingresso. Haveria envolvimento da população e incentivo ao esporte. Teríamos, provavelmente, uma cidade mais limpa e o Colosso com um público bem maior do que hoje.

Na minha otimista visão de futuro, um dia teríamos dois sujeitos brigando por uma “pet” vazia para completar a cota do ingresso. No fundo, estariam brigando para limpar a cidade. Isso se os próprios garçons não juntassem para trocar e assistir aos jogos ou vender os ingressos, fazendo assim uma renda extra.

Com isso, a prefeitura estaria também promovendo uma campanha permanente de incentivo a hábitos de cuidado com a cidade.

Infelizmente, a maioria de nosso povo não tem hábitos saudáveis de limpeza, portanto, não adianta a prefeitura fazer esforços sem envolver a população, e aqui cito duas situações que são emblemáticas do que falo. Em dezembro, quando aí estive, cansei de ver moradores colocando lixo na rua, para coleta, minutos após o carro do lixo ter passado. Consequência, predadores furando os sacos e lixo espalhado na rua até o dia seguinte.

Também em Alter do Chão vi a moradora de uma casa avarandada, gramado à frente bem cuidado, típica dos moradores de final de semana, levantar da mesa montada na varanda onde estavam outros comensais, caminhar e jogar um saco de lixo por cima do muro, para o terreno ao lado.

Estou convencido de que a população tem uma grande parcela de culpa pelo caos em que vivemos. Tal convencimento se funda na observação da quantidade de lixeiras depredadas pela cidade e o péssimo hábito de jogar o lixo para longe, mesmo que esse longe seja a porta do vizinho.

Também acho que já passou da hora dos governantes providenciarem a construção de uma estação de tratamento de esgoto e dedicarem mais atenção à coleta e tratamento de lixo. Não dá mais para Santarém conviver com lixo, sujeira e urubus.

É possível que alguém que more em Santarém ache que é exagero de minha parte, mas não é. O fato da pessoa estar aí, no dia a dia, faz com que as perdas se tornem imperceptíveis mas, alguém que passe, como eu, o espaço de um ano para voltar, percebe claramente quanta perda contabilizamos.

Mas, se mesmo assim houver resistência, copiando Geraldo Vandré e Théo Barros, “Disparada”, “Se você não concordar / Não posso me desculpar / Não canto pra enganar / …” E não engano! As borboletas se foram, os peixes estão cada dia mais raros, não há sombra para abrigar, nossas praias estão cada dia mais longe e nosso pássaro mais freqüente é o urubu.

Santarém está mais hostil a cada ano, mas não “Vou cantar noutro lugar”. Sou caboclo santareno, aí tenho minhas raízes, aí é meu chão e saí de Santarém, mas Santarém não saiu de dentro de mim. Creiam, dói-me fazer este depoimento, mas amor não é sempre dizer palavras bonitas. Às vezes é preciso usar palavras duras.

(*) Santareno, advogado e economista. Reside no Rio de Janeiro

2 comentários:

  1. Maria Clara - Caldas Novas - GO26/2/12 19:18

    Toda cidade tem muitos problemas no que tange higiene pública.O comentário certamente poderia servir para inúmeras cidades brasileiras, abandonadas pelas autoridades.
    Estive visitando Santarém e região há poucos meses atrás . Para quem é obrigada a se deslocar de barcos, não há como não perceber muitas coisas descritas acima . Fui ao Mercadão e reparei muita sujeira mas também visitei outros mercados e em torno e ví a mesma coisa. Parece que ninguém gosta de limpar em volta dos mercadões. De qualquer forma é triste porque Santarém tem tantos lugares lindos que contrapõe a essa situação na cidade. Lamento ler tudo isso porque gostei da cidade e de seu povo. Espero retornar.

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  2. Santareno com Vergonha26/2/12 20:32

    O pior de tudo isso que a prefeita e os secretários nos dão a certeza de que nenhum deles passa por essas ruas e se passam e não fazem nada é porque não tem vergonha mesmo ....

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