Rodrigo Lara Mesquita (*) para O Estado de S.Paulo
No momento em que o País discute no Congresso Nacional a reforma do Código Florestal e enfrenta grandes desafios de planejamento, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) extingue, em Campinas, a sua única área de excelência em gestão territorial estratégica.
A Embrapa Monitoramento por Satélite foi criada há mais de 20 anos com a finalidade de ser um instrumento estratégico do Ministério da Agricultura e do Estado brasileiro em planejamento e monitoramento territorial.
A equipe do centro desenvolveu sistemas inéditos, baseados no uso de satélites, para monitorar queimadas e desmatamentos na Amazônia; controlar a febre aftosa na faixa de fronteira; avaliar o alcance territorial das mudanças introduzidas na legislação ambiental; mapear a irrigação no Nordeste, a urbanização nos municípios brasileiros e a expansão da agroenergia; monitorar o andamento das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em todo o País e outros estudos. A maior parte dos resultados inovadores dessas pesquisas e prestações de serviços está disponível no site da Embrapa Monitoramento por Satélite (www.cnpm.embrapa.br).
Tendo em perspectiva a Eco-92 e as questões relacionadas à gestão territorial estratégica da Amazônia, apoiei a instituição, criada em 1989 por determinação do presidente José Sarney, e contribui para seu crescimento por meio do Comitê Assessor Externo (CAE). Rapidamente o centro passou a fornecer informações para diversos órgãos da Presidência da República, para as diversas cadeias produtivas da agricultura, para a mídia, para organizações não governamentais e para a sociedade brasileira em geral.
Os dados à disposição em seu site chegaram a receber mais de 1 milhão de hits diário, com picos em lançamentos de resultados de projetos inovadores como O Brasil Visto do Espaço, O Brasil Visto em Relevo ou ainda Rio Demene - um caminho para a Amazônia. O centro passou a receber e a formar estagiários, bolsistas, mestrandos e doutorandos da Universidade de São Paulo, da Unicamp, da Unesp, da Unip e outras, além de participar de diversos projetos de pesquisa internacionais e bilaterais em sua área de atuação.
Em razão dessa história exemplar, ao prestar serviços e trazer soluções tecnológicas adequadas, competitivas e viáveis na temática da gestão territorial, o centro angariou reconhecimento público por seu trabalho, gerando em 2008 - enquanto a problemática em torno das questões de ordenamento territorial ainda constava do seu norte estratégico - 461 notícias sobre suas atividades, em 253 veículos distintos de imprensa no Brasil e no exterior. Esse processo culminou, em 2009, com a inauguração de suas modernas instalações pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado de cinco ministros e autoridades do Judiciário e do Legislativo.
Em 20 anos de existência o centro gerou mais de uma centena de zoneamentos e sistemas de gestão e monitoramento territorial para a agricultura e o agronegócio, desde a escala local até a planetária. Foram mais de 100 mil mapas e publicações, e suas informações científicas beneficiaram milhões de usuários no Brasil e no exterior, além de mais de 2 mil parceiros e clientes diretos. Mapas mundi e do Brasil, gerados a partir de imagens de satélite pela área de Gestão Territorial Estratégica do centro, ainda decoram várias salas da presidente da República, do ministro da Agricultura e de autoridades do governo federal.
Com a mudança na direção do centro, no final de 2009, teve início um processo de paralisação de diversas atividades de prestação de serviços aos Ministérios da Agricultura, do Planejamento, aos órgãos da Presidência da República e às organizações da sociedade, acompanhada de uma pressão sobre pesquisadores que já rendeu um processo por assédio moral contra a atual chefia na Justiça do Trabalho. Em 2010, o centro deixou de utilizar mais de R$ 6 milhões disponíveis para o monitoramento de obras do PAC!
No início deste ano, a atual chefia tentou apagar o passado do centro, ao retirar do acesso público os resultados de cerca de 50 projetos e ações de pesquisa, num total de milhares de páginas. Os dados só retornaram ao site, dois meses depois, após intervenção do ministro Wagner Rossi. Ele atendeu aos reclamos de parceiros e usuários do site, numa movimentação que envolveu até o prefeito de Campinas em manifestação pública sobre o tema (http://www.campinas.sp.gov.br/noticias-integra.php?id=5111).
Essa ação destrutiva culmina agora com o desmonte injustificável da área de Gestão Territorial Estratégica e a destituição de sua liderança, efetivada sem nenhuma consulta prévia ao CAE, aos parceiros e beneficiários de seu trabalho na Casa Civil e no gabinete de Segurança Institucional da Presidência, em outros Ministérios e, principalmente, no da Agricultura.
É inacreditável a ousadia dos projetos pessoais de alguns e dos interesses escusos de outros, ao agir com a res publica como se fosse sua propriedade privada. Oxalá o governo federal e, em particular, o ministro Wagner Rossi e a presidente Dilma Rousseff saibam que o País não pode prescindir de um trabalho tão essencial para a defesa da agricultura brasileira, aqui e no exterior.
Se o ministro Rossi e a diretoria da Embrapa não reverterem esse descalabro do atual gestor do centro, serão no futuro responsabilizados pela sociedade civil pela perda de um precioso cabedal de gestão estratégica territorial. Por não compartilhar tal irresponsabilidade na gestão de um serviço estratégico para o Brasil, apresento publicamente minha demissão do Comitê Assessor Externo da Embrapa Monitoramento por Satélite.
(*) Jornalista, é Diretor da Radiumsistems - Peabirus
Twitter: @RMESQUITA
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