sábado, 29 de janeiro de 2011

Tortura não mais

Eliane Cantanhêde

Sabe qual a principal notícia, entre a vinda de Barack Obama em março, a discussão do salário mínimo, o presidente do TCU recebendo uma baba para palestras em órgãos que o tribunal investiga, o pobrezinho do Maranhão pagando rios de dinheiro para ex-governadores?

Na minha opinião, é a notícia publicada hoje pelo jornalista Evandro Éboli no jornal "O Globo" de que a Secretaria de Direitos Humanos vai enviar ao Congresso um projeto criando uma comissão especial para... investigar tortura nas prisões!

Muito se fala, com justo horror e asco, da tortura, das mortes e dos desaparecimentos de militantes políticos ocorridos durante o regime militar (1964-1985), mas a gente finge que não vê, não sabe, nunca ouvir falar em tortura de preso pobre e jogado em cadeias e penitenciárias pelo país afora.

Dá tontura só de pensar no que esses homens e mulheres passam nas cadeias, muitas vezes tratados como seres sub-humanos e roucos de tanto gritar sem que ninguém os ouça e os acuda, afora ONGs e voluntários esparsos e corajosos.

Para lembrar de um caso emblemático: aquele menina trancafiada numa cela só de homens no Pará, estuprada, maltratada, humilhada, marcada no corpo e na alma para todo o sempre.

Pelo projeto, a comissão terá onze membros, incluindo médico, psicólogo, arquiteto e assistente social, entre outros, e terá o poder de entrar nas cadeias e penitenciárias sem aviso prévio, sem consentimento dos diretores. Pode também ir atrás de uma denúncia, anônima ou não, ou simplesmente decidir ir por vontade própria.

A ideia vem do secretário anterior, Paulo Vannuchi, e foi bem encampada por sua sucessora, Maria do Rosário. Eles e ela - a comissão - têm a cara do Brasil que a gente vai construindo aos trancos e barrancos: um país mais desenvolvido, mais democrático, mais justo e mais humano.

Criminosos, por piores que tenham sido seus crimes, têm direito à Justiça, ao respeito e a um tratamento humano edigno proporcionado pelo Estado. Até porque somos nós que pagamos, não um brutamontes qualquer que usa o cargo, o distintivo e o poder fugaz para descontar no outro suas mágoas da vida.

(*) Jornalista e Colunista da Folha de São Paulo desde 1997.

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