Luiz Caversan (*)
Dois episódios envolvendo a Polícia Militar de São Paulo deixaram bem claro, nesta semana, o dilema em que vive a população da principal cidade do país no que se refere à segurança, diante dos agentes públicos cujo lema é, ou deveria ser, aqui e lá fora, proteger e servir.
São duas situações emblemáticas que permitem um corte na sucessão de casos em que a nossa PM vê-se questionada no que se refere ao seu papel na sociedade e que permite a pergunta: qual a polícia que nós, cidadãos-paisanos, queremos para a nossa cidade?
Há pelo menos duas "polícias" com as quais temos de conviver, a saber:
Polícia 1 - um sargento fora de si (e completamente fora de forma, por favor, que barriga era aquela!) agride a tapas e empurrões e saca a arma e vocifera com um aluno da USP durante um protesto pacífico no campus da universidade. Cabeludo, o aluno era o único negro no grupo que discutia com os policiais e foi o único a ser agredido. A cena deprimente foi gravada por um celular e circulou largamente nas redes sociais ao longo da semana. O policial foi afastado de suas funções e tanto ele quanto a corporação certamente serão alvo de vários processos cíveis.
Polícia 2 - acionados pelo telefone 190, policiais militares levaram menos de dez minutos para chegar a uma residência que estava sendo assaltada no bairro do Sumaré. Enquanto o agente do serviço remoto orientava a moradora pelo telefone, os demais soldados, eficientemente, invadiam a moradia e rendiam os criminosos. Sem um tiro, sem nenhum morto ou ferido. Coisa de filme estrangeiro.
Ou seja, há uma polícia, sim, tecnicamente preparada, com soldados treinados, equipados e prontos para agir em defesa das pessoas de bem, no caminho que deveria ser natural para que todos a respeitassem e dela sentissem orgulho. Uma verdadeira polícia cidadã.
E há a PM despreparada, mal treinada, violenta, preconceituosa, que continua agindo como há 30 anos, quando o papel da corporação, a serviço e a soldo do regime militar (durante anos a PM de São Paulo foi comandada por um oficial superior do Exército, quando os militares dirigiam o país), era principalmente reprimir --fossem bandidos ou os "subversivos", ou seja, todos aqueles que ousassem discordar do regime totalitário e antidemocrático em vigor.
Os vícios de então permanecem arraigados e podem ser constatados em diversos episódios vividos pela corporação ao longo dos anos (Favela Naval, Rota 66, a morte do jovem motociclista na porta de casa e na frente de familiares, dentre tantos...).
Mas a ação dos agentes públicos no caso do Sumaré (assim como em diversos outros, que não ganham notoriedade, mas ocorrem cotidianamente) demonstra que houve avanços, há pessoal qualificado e é possível contar com uma força que sabe e pode cumprir seu dever satisfatoriamente.
Trata-se, portanto, exatamente disso: cumprimento do papel que a sociedade delegou a esses funcionários públicos, que precisam agir não apenas dentro da lei, mas, sobretudo respeitando os preceitos básicos de civilidade.
Para que, quem sabe um dia, esta polícia possa ser admirada pela população que paga seus salários e merece sua proteção e respeito.
(*) Jornalista e consultor na área de comunicação corporativa da Folha de São Paulo
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