terça-feira, 27 de setembro de 2011

A lei da Fifa

Juca Kfouri (*)

A presidente Dilma Rousseff tem acertado ao não ceder às exigências da Fifa, entidade máxima do futebol, para a realização da Copa do Mundo no Brasil, em 2014.
O mais novo motivo de disputa é a Lei Geral da Copa, que define regras para sediar o Mundial no país, como políticas de ingresso, distribuição de direitos de mídia e garantias dos patrocinadores.

A Fifa parece buscar, na prática, autonomia total para definir essas questões, como se não houvesse uma legislação nacional em vigor.
A questão dos ingressos é exemplar.

O Estatuto do Idoso garante meia-entrada aos maiores de 60 anos, assim como leis estaduais preveem o desconto também para estudantes.
Não há por que suspender esses direitos na Copa e deixar a definição para a Fifa.

Também vai na direção correta a decisão do governo federal de liberar até 3% do tempo dos jogos e 30 segundos dos eventos oficiais para emissoras que não detêm os direitos da Copa.
Essa fatia não chega a prejudicar as empresas que pagarem pelo evento, que terão a exclusividade em sua transmissão.

Compreende-se a preocupação da Fifa, que nos últimos quatro anos ganhou cerca de US$ 4 bilhões com esse tipo de negócio.
Mas deve-se buscar um equilíbrio entre o lucro das empresas, e também o da Fifa, e o acesso dos brasileiros à maior celebração do calendário mundial do futebol, que voltará ao país depois de 64 anos.

O governo já cedeu bastante à Fifa, atendendo a exigências -muitas delas razoáveis- que inflaram os custos do evento em pelo menos dezenas de milhões de reais.

A preparação para a Copa avança a passos lentos.
As prometidas melhorias de infraestrutura estão em risco. A ampliação dos aeroportos será mais tímida do que se imaginava. O investimento no transporte público pouco avançou, e já se cogita decretar feriado nos dias de jogo para evitar, ou amenizar, um vexame.

Até hoje, nem o governo sabe, como admite a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, quanto vai custar o evento.
Um ambiente de fragilidade institucional, com as leis do país suspensas para atender a uma entidade privada, seria um novo golpe no duvidoso legado da Copa.

A experiência bem-sucedida da Alemanha, em 2006, deve servir de exemplo para o governo brasileiro negociar com a Fifa, respeitando direitos empresariais sem, no entanto, ferir os interesses do país.
A Lei Geral da Copa será agora analisada pelo Congresso, ambiente em que lobbies e pressões costumam surtir efeito.

O governo deve vetar mudanças que alterem o cerne dessa legislação.

(*) Formado em Ciências Sociais pela USP. Desde 2005, é colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. Comentarista esportivo da ESPN

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