Fernando Canzian (*)
Em 20 de janeiro de 2009, sob um frio insuportável, cerca de 2 milhões de pessoas homenagearam a posse de Barack Obama no National Mall. A aglomeração é uma das maiores da história da capital americana.
Obama assumiu com imenso apoio popular. Tinha o controle democrata na Câmara, no Senado e a maioria dos governadores ao seu lado.
"Yes, we can!" (sim, nós podemos), era seu mantra.
De seu antecessor republicano, George W. Bush, herdou "heranças malditas" de fazer Lula corar ao esculhambar FHC.
Bush lhe repassou duas guerras bilionárias (no Afeganistão e no Iraque), uma prisão sem lei (Guantánamo) e a mais extraordinária crise financeira desde a década de 1930.
De imediato, o novo presidente prometeu atacar os três pontos: sair do Iraque, fechar Guantánamo e, mais importante, promover mudanças profundas no setor financeiro dos EUA.
O instituto Gallup marcava 78% de apoio popular quando o presidente delineou essa agenda.
Mas Obama revelou-se um fiasco.
Com o desemprego acima de 10%, priorizou mudanças controversas no sistema de saúde. E queimou em 2009 quase todo o seu capital político com a reforma, inconclusa até hoje.
Em vez de apontar o dedo para os republicanos que lhe entregaram a crise financeira e as guerras (sua "herança maldita"), deu a mão a W. Bush.
A ponto de chamar o ex-presidente a ajudar na reconstrução do Haiti pós terremoto de 2010 (virou hit o vídeo em que Bush limpa a mão na camisa de Bill Clinton após ser tocado por um flagelado em Port-au-Prince).
O bom moço Obama também insistiu em fazer política "across the aisle" (do outro lado do corredor) ao tentar buscar consenso com os adversários republicanos.
Seria recalque?
O que Obama colheu foi a perda da maioria na Câmara no final de 2010 e o surgimento dos movimentos radicais republicanos "Tea Party", que reúnem o que há de mais retrógrado na política americana.
No setor financeiro, quase três anos depois da crise de 2008 e do dramático resgate estatal ao sistema, os maiores bancos dos EUA voltavam a ter lucros bilionários e a reservar gordos bônus a executivos.
Já as mesmas agências de classificação de risco que avalizaram a esbórnia pré crise (e que Obama prometeu reformar) agora ameaçam rebaixar as notas da dívida dos EUA. Que só explodiu como último recurso para salvar o sistema após a leniência republicana sob oito anos de W. Bush.
Por conta da dívida, essa mesma oposição republicana fará Obama sangrar até a eleição de 2012.
"Yes, we créu!"
(**) Charge da última revista "The Economist" ironiza como um pequeno movimento radical americano de direita, o "Tea Party", pode levar republicanos, os EUA e o mundo de volta ao abismo. "Alguma coisa está definitivamente errada aqui..."
(*) Jornalista é repórter especial da Folha de São Paulo
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