Dora Kramer(*) para O Estado de S.Paulo
A regra é clara: o salário mais alto a ser pago no funcionalismo público é o equivalente ao que recebem os ministros do Supremo Tribunal Federal, hoje fixado em R$ 26.723,13.
Embora seja o que diz a Constituição, não é o que ocorre no Senado nem o que pensa o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1.ª Região, que cassou a liminar de um juiz de primeira instância proibindo - a pedido do Ministério Público - o pagamento de salários acima do teto a cerca de 700 dos 3 mil funcionários do Senado, que acumulam vantagens e benefícios e chegam a receber R$ 35 mil por mês.
O cálculo é estimado porque a Casa presidida por José Sarney não fornece o dado correto nem aos órgãos de controle, em outra transgressão constitucional, desta vez ao preceito da transparência que deve nortear a administração pública.
A decisão ainda não é final, mas de qualquer forma evidencia um conluio entre os Poderes Judiciário e Legislativo em atuação na defesa de seus próprios interesses.
A Mesa do Senado, ao recorrer da primeira sentença, mostra total desapreço pela palavra empenhada - e pelo dinheiro gasto com serviços contratados à Fundação Getúlio Vargas - de fazer uma reforma administrativa e controlar os gastos.
O tribunal, por sua vez, agiu também em causa própria: procura agradar ao comando do Senado na expectativa de que venha a ser agraciado por ele com apoio à elevação do teto salarial. Unem-se, assim, os dois Poderes, num esforço para agredir a lei e lesar o Erário.
A argumentação do presidente do TRF, Olindo Menezes, para cassar a liminar é um verdadeiro elogio à desfaçatez. Disse ele que manter a proibição do pagamento de salários acima do teto constitucional poderia "lesar a ordem pública", pois o "corte abrupto" inviabilizaria os trabalhos do Senado.
Corte abrupto? O tema está há meses em pauta. E ainda que a redução fosse repentina, no que isso prejudicaria o funcionamento do Senado superfaturado em efetivo e privilégios?
Certamente nenhum dos funcionários do Senado, detentores ou não de supersalários, se disporia a abrir mão de um emprego que não encontra paradeiro em matéria de condições vantajosas na iniciativa privada.
Ademais, o que lesa a ordem pública não é o cumprimento da lei, mas alianças nocivas entre instituições da República que avocam a si o direito de abusar de suas prerrogativas.
Ação temerária.
O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, apresentou suas credenciais para escolher relatores de projetos, ao justificar a indicação de Eduardo Cunha para relator da reforma do Código de Processo Civil: "Ele me pediu em fevereiro".
Ou seja, com o líder e deputado decano da Casa é assim: quem pedir leva. Independentemente da qualificação (ou desqualificação) para a tarefa.
Henrique Eduardo Alves bancou a indicação e também sustentou posição em favor da permanência de Pedro Novais no Ministério do Turismo contra a opinião de metade da bancada que lidera.
Vai cavando, assim, a abertura de larga cunha em seu projeto de presidir a Câmara na sucessão de Marco Maia. Se a bancada quiser, começa por destituí-lo da liderança já no ano que vem.
Se o líder apurar os ouvidos, ouvirá de liderados que o acordo feito com o PT foi o de contemplar "um" deputado do PMDB, não necessariamente "o" deputado Henrique Eduardo Alves.
No paralelo.
O esforço do ex-presidente Lula para se manter no noticiário a fim de não perder os requisitos da perspectiva de poder é legítimo.
Mesmo que isso suscite suspeitas de que esteja em campanha para 2014 e reduza, assim, Dilma Rousseff à condição de uma presidente-tampão.
Mas, daí a despachar com ministros do governo dela cobrando informações e providências de forma a responder a cobranças de sua "base", vai uma boa distância.
Aquela que separa a atuação política com aspirações eleitorais aceitáveis do desrespeito à pessoa da presidente e à instituição presidencial.
(*) Jornalista
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