sábado, 1 de fevereiro de 2014

O pior do pior de 2013 (e da década!)

Paulo Rabello de Castro (*) 

No ano velho, o dispêndio público federal mais uma vez explodiu, como em cada ano desta década, sem "falhar" um único período desde 2004. O governo converteu-se num gastador compulsivo e dissimulado. Em 2013 o rega-bofe tornou-se um escárnio: o gasto total do governo cresceu quase 15%, o dobro do crescimento do produto interno bruto (PIB) tributável, que paga a gastança - o PIB nominal só aumentou cerca de 8% no ano passado. 

Recordes de arrecadação são comemorados como algo positivo. Não é casual. 
O Estado gasta demais, a sociedade paga a conta e isso se transformou no grande nó que amarra o desenvolvimento do País. O estouro da despesa pública em todos os níveis está no centro da explicação - a única plausível - para o baixo desempenho da economia brasileira. A afirmação pode soar contraintuitiva. Mas é exata. 
No Brasil, o governo é que impede o desenvolvimento que ele mesmo se propõe a conduzir. Nem Keynes discordaria: sua lição de ampliar gastos públicos como remédio numa severa recessão em nada se aplica para justificar a explosão do gasto público total. Tendo a despesa pública brasileira se tornado veneno, como podemos denunciar e combater essa tragédia coletiva no debate eleitoral de 2014? 
Será que os candidatos sabem e compreendem a natureza do mal da despesa pública excessiva? 

A natureza nos ensina. No cultivo de cítricos, a doença mais grave de um pomar é o "declínio". De origem desconhecida, o declínio vai atingindo as árvores mais vulneráveis, sempre de modo gradual. A árvore não morre, mas já não consegue produzir como antes. Algo a devora por dentro, como um câncer. A anterior vitalidade é substituída por uma produtividade recessiva da planta. Como no declínio dos cítricos, também alguma coisa consome o vigor da economia brasileira. E por ser algo lento e mudo, torna-nos desatentos à malignidade do processo. 

No declínio da economia, a única estrutura que explode em crescimento é o próprio governo, devorando o resto à sua volta. Ao crescer, por uma década, ao dobro do ritmo da economia produtiva, o setor público vai inchando em patológica progressão. Instala-se um processo de substituição das forças da sociedade e dos mercados pela articulação típica dos processos facciosos na decisão de gastar. Gasta-se para nada. Gasta-se para agradar a grupos, para pacificar descontentes, comprar mais poder, para ir ficando. 

Vamos aos números. No Plano Real, há duas décadas, o gasto total do Estado nacional, nos seus três níveis de comando, ainda era a quarta parte do PIB brasileiro, o que já representava um nível superior ao de países de semelhante estágio de renda per capita. Hoje o tamanho do setor público atinge 40% do PIB, ombreando-se com a velha Europa, mas sem qualidade de serviço público. Está aí o cerne da questão. 
O Estado brasileiro explodiu, consumindo tudo à sua volta. Avançou como uma célula anormal, devorando o resto sem piedade. A enorme velocidade com que isso tem ocorrido é o traço essencial que distingue o caso da expansão do Estado no Brasil. 
Não existe paralelo mundial para o que vem sucedendo aqui. 
O tamanho do Estado quase dobrou, empurrando a carga tributária para um patamar insuportável, ao tornar o País um dublê de selva burocrática e manicômio tributário. 

A extração de meios para a "sobrevivência" do governo é alcançada pelo confisco da poupança das famílias e pela derrama sobre o caixa gerado nas empresas. 
Ano após ano, as famílias deixam de fazer poupanças voluntárias e as empresas deixam de investir seus lucros, levados pelos escorchantes impostos que se recolhem ao longo do processo produtivo. O Estado extrator, ao contrário, quer sempre mais. 
Pior: os recursos extraídos da sociedade passam longe dos investimentos sociais e da melhoria da infraestrutura. Como a capacidade investidora do Estado é incomparavelmente menor que a dos contribuintes, trocamos avanços do setor privado pela debilidade investidora do Estado. Não é surpresa que nossa taxa de investimento seja a mais baixa entre todos os nossos vizinhos na região e uma das mais baixas do mundo emergente. 

Capa da revista britânica The Economist estampou o Brasil como um foguete descontrolado - de fato, a estátua do Cristo Redentor caindo do Corcovado, numa insólita expressão do humor trash dos britânicos.
A revista fazia referência a outra capa, de 2010, em que o Cristo Redentor decolava do morro, exprimindo a esperança dos estrangeiros na força investidora do Brasil naquele momento. Má avaliação e equívoco flagrante de prognóstico. 
O Brasil nunca contratou o progresso acelerado antevisto pela publicação inglesa. 

Estamos nos comendo por dentro. Apenas temos muito para devorar antes de fenecer. 
Não é progresso, é mera transferência da vitalidade de uma grande nação para um insaciável aparelho estatal que, no caminho, vai distribuindo "o peixe", em vez de entregar a vara de pescar. Minamos as chances de progresso verdadeiro. 
Mantemos, apesar da arrecadação pantagruélica, uma educação de baixa qualidade e um sistema de saúde pública de fancaria. Nada senão o excesso de gasto explica o mal que nos acomete. 

O diagnóstico do excesso da despesa pública é a grande razão por que as eleições de 2014 são tão importantes. O debate eleitoral poderá propiciar nossa última chance de constatar duas coisas: primeiro, quão distantes estão os candidatos de um diagnóstico verdadeiro do que realmente tem sufocado o progresso nacional; e, por fim, quão próximos ainda estamos de repetir, em 2014, mais um ato continuísta da trágica política econômica do "declínio". Para conter o avanço do Estado e resgatar as chances de progresso da sociedade brasileira é fundamental pactuar uma regra clara de crescimento da despesa corrente pública. 

(*) É economista e coordenador do Movimento Brasil Eficiente (www.brasileficiente.org.br).

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