domingo, 10 de novembro de 2013

Eles não gostam de futebol

Otávio Maia (*) para o Blog Esporte Fino

O principal problema do futebol brasileiro não é de ordem tática, técnica ou física; é o fato de que os donos do negócio se esquecem frequentemente de que o espetáculo só faz sentido se houver uma plateia. Ao tratar o torcedor como um mero detalhe, e não como parte essencial do show, distanciam os fanáticos dos estádios e dos seus clubes e enfraquecem o esporte. Isso fica claro em diversas ocasiões, do agendamento de jogos em horários esdrúxulos ao completo descaso nos serviços dentro e fora dos estádios. Mas sempre há formas de nos surpreender. Nesta semana, o ex-presidente corintiano Andrés Sanchez nem corou ao dizer que a redução de preço nos ingressos promovida pelo São Paulo no Brasileirão provocou um mal ao futebol brasileiro. 

“O que o São Paulo fez em um momento difícil foi um mal para o futebol brasileiro como um todo. Eu acho péssimo você pagar R$ 5, R$ 10, por um espetáculo. Isso é péssimo”, disse ele. Andrés foi acompanhado por Carlos Eduardo Paes Barreto, diretor da OAS Arenas, responsável pelo consórcio da Arena Fonte Nova. “Quando se paga pouco, você tende a não valorizar o que está usando.” 

Qualquer um que dissesse que a estratégia de reduzir o preço dos ingressos fez mal ao São Paulo provavelmente teria sua sanidade questionada, já que depois da promoção o clube encheu as arquibancadas, aumentou as receitas e multiplicou seus resultados dentro de campo, fugindo com categoria do rebaixamento. Mas a dupla Sanchez-Barreto vai além. Diz que a iniciativa faz mal não ao clube, mas ao futebol como um todo. 

A lógica de Andrés e Carlos Eduardo é muito curiosa. Para eles, não é a qualidade do espetáculo que determina o seu valor, mas o valor dos ingressos que define o espetáculo. Na visão desses dirigentes, se caem os preços, mesmo que as arquibancadas estejam mais cheias, os cofres mais gordos e as redes balançando com mais frequência, alguém fez “um mal ao futebol”. 

No fundo, cada um só está defendendo seus interesses, e não há nenhuma novidade nisso. Estamos falando dos responsáveis por duas novas arenas, que precisam muito gerar forte arrecadação com bilheteria nos próximos anos – em especial o Corinthians, que empenhou suas receitas futuras com bilheteria para bancar a conta cada vez mais alta do estádio de Itaquera. 

Mas me pergunto até que ponto essas pessoas, que vivem do futebol, gostam de verdade do esporte. Porque alguém que já assistiu a uma partida no silêncio deprimente de um estádio vazio ou no calor contagiante de uma arena lotada não pode jamais relativizar a importância do torcedor para o espetáculo. E isso tem gente fazendo sem nenhum constrangimento. 

(*) Jornalista e Relações Públicas

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