Miriam Leitão (*)
Se a Grécia sair do euro, o primeiro afetado será o próprio poupador grego. Ele perderá parte do valor dos seus ativos financeiros, porque a taxa de conversão do euro para a dracma embutirá uma desvalorização.
Um calote total na dívida afetaria os bancos que recentemente deram um desconto nos títulos, além do FMI e do Banco Central Europeu. Sem reservas, o país teria dificuldades até de importar.
Não há cenário bom para a Grécia, mas há um pior que os outros. A saída desordenada certamente agravaria mais a situação econômica do país. O início da corrida bancária é o primeiro sinal de que os investidores gregos podem estar se perguntado a que taxa seus euros depositados hoje serão transformados em dracma.
O drama não é apenas grego. Os bancos perderiam ainda mais do que já perderam com a renegociação da dívida. A Europa como um todo perderia porque se quebraria o dogma de que a união monetária é irreversível.
O primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy, admitiu que poderá enfrentar dificuldades de rolagem da dívida se o país não cortar o déficit público.
O continente permanece suspenso no ar. O fato de a Grécia não ter conseguido formar um novo governo deixa a crise em compasso de espera. Novas eleições só daqui a um mês.
A corrida bancária não é grande para o total de ativos — cerca de 700 milhões foram sacados dos bancos gregos na segunda-feira — mas impressiona o movimento. Poderá se agravar se a perspectiva de sair do euro ficar mais forte.
Voltamos ao estágio de risco de calote grego, que parecia encerrado quando houve a negociação do acordo que distribuiu perdas para os bancos e compromissos de austeridade para a Grécia.
Em troca, ela receberia ajuda da Europa. Não receber ajuda significa não conseguir rolar as dívidas do país que vencem este ano.
Por sua vez, a ameaça de deixar a Zona do Euro, segundo a economista Monica de Bole, da Galanto Consultoria, representa um calote ainda maior, desordenado, com potencial de chegar a 365 bilhões, quase 2 vezes o PIB da Grécia.
— Voltar à dracma é dar dois calotes. O primeiro seria nos títulos públicos gregos, da dívida externa, que já foram renegociados e passaram a ter prazos de vencimentos mais longos. Isso, na prática, se perde. Outro, ainda maior, seria sobre o BCE, o FMI, e todos os bancos da Europa, principalmente os da Alemanha, que emprestaram dinheiro a bancos gregos ou fizeram intermediação financeira com eles — explicou Monica.
Ficar no euro tem sido doloroso. O PIB grego recuou 6,1% no primeiro trimestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2011. O desemprego está acima de 20%, e entre jovens passa de 50%.
Motivos não faltam para o descontentamento e isso se refletiu nas urnas. O problema é que a opção de saída da Grécia da Zona do Euro pode ser ainda mais dolorosa.
A desvalorização embutida na volta à velha moeda pode provocar inflação, mesmo com o PIB em queda. O país entraria num período de recessão com inflação. A dívida externa grega continuaria em euros, mas o país teria uma moeda que passaria a flutuar.
Se 1 euro passasse a valer 2 dracmas, isso dobraria a dívida em termos nominais. A desvalorização poderia aumentar a competitividade, mas o país não é grande exportador. Ao contrário da Argentina, que deu a volta por cima com suas commodities e um bom momento da economia mundial.
— Essa é uma grande diferença entre o caso grego e o argentino, em 2001. A Argentina deu o calote e desvalorizou a moeda. Logo em seguida, foi beneficiada por um longo período de crescimento da economia mundial que ajudou muito na recuperação. Os gregos, ao contrário, têm um cenário de crise na Europa e baixo crescimento do mundo — disse Monica de Bolle.
O que embaralhou mais ainda a Grécia foi o resultado da eleição. O parlamento se fragmentou com forças políticas que vão da esquerda radical, o segundo colocado, ao partido nazista.
As pesquisas continuam informando que os gregos preferem permanecer com o euro. Os líderes europeus querem usar o resultado dessas pesquisas para dizer aos gregos que a permanência no bloco depende exclusivamente deles.
As eleições de junho devem se transformar numa espécie de referendo: cumprir o que foi acordado e permanecer no bloco; rasgar o acordo, sair da Zona do Euro e deixar de receber a ajuda. A propósito: George Papandreau caiu quando propôs um plebiscito.
A crise na Europa tem custado caro às empresas do bloco. Desde março de 2009, segundo levantamento da consultoria inglesa Capital Economics, as bolsas americanas subiram 68%, a da Inglaterra se valorizou 48%, enquanto as da Zona do Euro tiveram ganho de apenas 12%.
Os bancos europeus são os que mais sofrem porque estão constantemente sendo ameaçados de calote. A bolsa alemã ganha 37%; a da França, 17%; enquanto a dos países em crise estão em queda: Grécia, -68%; Espanha, -14%; e Itália, -8%.
A confusão externa tem afetado também o Brasil. O Ibovespa mudou totalmente de direção: de uma alta de 20% até março fechou ontem em queda de 4,8% no ano.
(*) Jornalista e colunista do jornal O Globo
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