Marcilio R. Machado (*)
A previsão de entrada de empresas estrangeiras no mercado brasileiro em razão das expectativas favoráveis da economia do Brasil é motivo de preocupação.
As mudanças demográficas que têm ocorrido no País com a inserção de milhões de brasileiros no mercado de consumo e a necessidade de efetuar investimentos em obras de infraestrutura para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos têm atraído a atenção de investidores de todo o mundo. A crise atual, principalmente na Europa, com consequente ajuste fiscal, pode implicar uma recessão naquele continente ou, na melhor das hipóteses, um baixo crescimento econômico que pode durar alguns anos.
O cenário de recessão no Hemisfério Norte pode ocasionar um aumento da concorrência entre os países emergentes e fazer com que haja maior infiltração de produtos chineses, que têm vantagem competitiva baseada em custos baixos. Poderão as empresas brasileiras sobreviver diante da competição chinesa?
A China é o maior parceiro comercial do Brasil e as empresas chinesas, alavancadas principalmente em vantagem de custos, expandiram a sua participação no País. Os pesquisadores Akhter e Barcelos desenvolveram um estudo com o intuito de analisar a maneira como as empresas brasileiras estão respondendo a esses desafios.
A pesquisa indica que os executivos brasileiros têm respondido por meio de mudança na estratégia de suas organizações, enfocando uma orientação maior voltada para o cliente. De um modo geral, o desempenho da maioria das empresas foi positivo, enquanto a lucratividade foi reduzida. Isso significa riscos para as empresas, pois o lucro pode exprimir, em muitos casos, o custo de estar no negócio e a garantia de emprego no futuro.
Houve mudanças de estratégia em diferentes áreas de marketing, tais como segmentação, posicionamento, construção de marcas e relacionamento com os clientes. Também algumas empresas buscaram consolidar a sua posição no mercado, enquanto outras tentam se expandir internacionalmente. Mas isso seria suficiente para sustentar um aumento da intensidade competitiva resultante de uma provável recessão na Europa, que é o destino principal dos produtos chineses?
Os autores sugerem que os executivos brasileiros terão de investir em inovação de processos e produtos, pois isso lhes permitirá escapar da concorrência de um mercado onde o preço é um fator determinante de sucesso. O foco em inovação permitirá que as empresas possam subir na escala de valor agregado para competir com elementos não baseados em preços.
Quando se trata de competição com a China, a Alemanha pode servir como um exemplo a ser imitado. Com exceção da China, a Alemanha foi o único país que conseguiu aumentar a participação de suas exportações no mercado internacional. Possuidora de indústrias com mais de cem anos de existência, os alemães investiram em inovações contínuas e modernizaram suas indústrias. Com excelentes universidades técnicas, melhoraram processos e voltaram a ocupar o topo do setor industrial. Os alemães reformaram a sua legislação trabalhista de modo que se transformasse na mais flexível do planeta. O trabalhador alemão, por exemplo, pode trabalhar de zero a 60 horas por semana, o que lhes dá uma grande vantagem.
Embora tenha perdido a posição de maior exportador mundial para a China, a Alemanha continua apresentando resultados expressivos nas suas exportações de manufaturados. O pesquisador Hermann Simon relata que, diferentemente do que muitos imaginam, as empresas líderes de mercado mundial na Alemanha são de tamanho médio. Segundo sua estimativa existem 2.500 empresas líderes de mercado em todo o mundo, e 1.200 delas se encontram na Alemanha. Essas empresas participam de 25% do total exportado pelo país. A maioria delas é familiar e localizada em comunidades rurais. Elas competem por meio de valor superior, e não custos, e se colocam próximas do mercado para obter feedback para inovação. Simon constatou que, também na China, 68% do total das exportações é proveniente de empresas com menos de 2 mil empregados, e não de grandes corporações.
O famoso economista Schumpeter foi o primeiro a defender que apenas por meio da inovação e do empreendedorismo pode um negócio, com exceção de um monopólio governamental, sobreviver no longo prazo. Além disso, ele foi bem claro ao enfatizar que a inovação e o empreendedorismo podem ocorrer nas grandes, médias e pequenas empresas, apesar da existência de obstáculos burocráticos.
O seu legado também indica que quase todos os negócios um dia falham e falham por falta de inovação. São muitas as barreiras às inovações, tais como as resistências e incertezas de fazer algo que não estava sendo feito anteriormente. Entretanto, como reportou Schumpeter, inovação requer desequilíbrio contínuo liderado por empresários obcecados com aquilo que estão fazendo. Inovação seria, então, não uma proeza do intelecto, mas do desejo, da vontade, da força de uma liderança.
Surpreendentemente, alguns setores empresariais pressionam o governo brasileiro por proteção para que não haja um aumento de sua capacidade ociosa decorrente, principalmente, da entrada de produtos estrangeiros, vindos principalmente da China. Na realidade, as pressões às quais as empresas brasileiras estão sujeitas requerem muito mais do que o retorno do protecionismo exacerbado contra a concorrência internacional. A imposição de barreiras tarifárias e não tarifárias pode ocultar algumas deficiências de algumas empresas e atrasar os investimentos em inovação necessários para que elas possam competir com igualdade de condições quando a crise atual passar.
Diferentemente de aumentar o protecionismo, recomenda-se reduzir a burocracia brasileira de modo que, como na China e na Alemanha, as pequenas e médias empresas possam ser inseridas no esforço de exportar produtos com maior valor agregado.
(*) Membro do Conselho de Administração da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diretor da Famex Importadora e Exportadora, é doutor em Administração de Empresas pela Nova Southeastern University
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